Christina Fontenelle
09/01/2007
E-MAIL: Chrisfontell@gmail.com
BLOG/artigos: http://infomix-cf.blogspot.com/
BLOG/Série CAI O PANO: http://christina-fontenelle.blogspot.com/
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No dia 1 de dezembro de 2006, a agência de notícias Reuters divulgou nota emitida pela JP Morgan a respeito da classificação de companhias aéreas. A JP Morgan é uma corporação internacional que fornece serviços financeiros dos mais variados tipos, no mundo todo, trabalhando com recursos que atingem a estratosférica soma de U$ 1,3 trilhões, em mais de 50 países. O grupo JP Morgan Securities melhorou a nota da empresa de aviação Copa Holdings de "underweight" para "neutro" e reduziu a classificação das companhias aéreas Gol e TAM de "neutro" para "underweight", informando, ainda, que não acredita mais que as duas poderão atingir as expectativas do mercado em 2007. Segundo o grupo, a Copa continua sendo um ponto de referência no mercado aéreo latino.
Ora, se a Copa vai bem, a Gol tende a seguir seus passos, mesmo que seja tecnicamente absorvida por ela, já que existe uma aliança comercial entre as duas companhias aéreas, desde agosto de 2005, para expandir a capacidade de ação pela América Latina. A Copa tem várias outras lucrativas alianças. Uma delas é com a Continental Airlines - a sétima maior empresa aérea do mundo, que transporta, aproximadamente, 41 milhões de passageiros por ano, na mais moderna frota de jatos dos Estados Unidos. A Copa também tem alianças com a Continental Connection - a quinta empresa aérea regional dos Estados Unidos -, operada pela Gulfstream International Airlines; com a Northwest Airlines - a quarta maior empresa aérea do mundo, oferecendo vôos para 750 cidades em 120 países nos seis continentes; e com a Mexicana de Aviación - uma empresa aérea internacional que atende a 55 destinos na América do Norte, Central, América do Sul e Caribe. Portanto, a Gol toma parte em um conglomerado de empresas aéreas bem-sucedidas internacionalmente.
A companhia brasileira, que se nomeia de Linhas Aéreas Inteligentes, foi concebida como uma companhia aérea de “baixo-custo – baixa-tarifa” (Aqui, TODOS podem voar! - dizia o slogan). A concepção sempre prometeu muitos lucros, operando uma frota simplificada, com classe única de serviços, baixos custos para manutenção, para combustível e para treinamento. As ações da GOL estão listadas na NYSE e na Bovespa desde Junho de 2004. Desconforto e escassez de serviços de bordo é ao que os passageiros se submetem em troca de passagens mais baratas. É o conceito de “gado-humano” da globalização, transportado e traduzido pela indústria de transportes aéreos de passageiros.
É obvio que, com a cada vez mais mundialmente acentuada concentração de renda e com o empobrecimento generalizado das chamadas classes médias, a corrida a este tipo de “solução” para locomoções rápidas entre grandes distâncias acabaria por quebrar com quaisquer outras companhias aéreas concorrentes que não acabassem por se igualar em termos de serviços e de preços oferecidos. Resultado: cartelização, monopolização, baixos custos, empregados sujeitos a salários mais baixos, poucos serviços oferecidos aos passageiros e muitos lucros obtidos pelas companhias aéreas. Isso, caros leitores, está muito longe de ser o que sempre foi concebido como livre concorrência de mercado. É plano infalível de monopolização. E o fenômeno é mundial.
Aqui no Brasil, assessorado por Daniel Mandelli Martin, ex-presidente da Tam, o ex-deputado e ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu, desde que estava oficialmente na ativa, planejava reestruturar a complicada aviação comercial brasileira, deixando a Vasp minguar e direcionando a Varig apenas para vôos internacionais. As rotas internas seriam divididas entre a Tam e a Gol, com uma certa vantagem para a primeira. Não foi coincidência a compra de um Airbus 319 para a Presidência da República, já que a Tam é representante da Airbus no Brasil. Não é que, hoje, “no frigir dos ovos”, as coisas todas caminharam como Dirceu planejara?
A Transbrasil, que tem (ou tinha) como advogado o compadre do presidente Lula, Roberto Teixeira, recebeu do governo perto de R$ 400 milhões em ajuda (para Varig, não deu) e o casal dono da companhia, Marise e Antonio Celso Cipriani, saiu ileso da CPI do Banestado, cujo relatório sugeria que ambos fossem investigados pelo Ministério Público. Coincidentemente, foi no ano do desaparecimento da Transbrasil que surgiu a Gol, inicialmente com uma frota de apenas 5 aviões distribuídos em rotas diversas e estratégicas pelo país. Em 5 anos a empresa agigantou-se inimaginavelmente. Coincidência mais conveniente essa!
A VASP, apesar de ter sobrevivido até 2005, já passava por uma grave crise financeira e acabou por desaparecer. Restava, além da TAM e da emergente Gol, a Varig. A empresa não conseguiu ajuda do governo (que devia à Varig cerca de R$ 2 bilhões) e não teve sua falência decretada, o que acabou dificultando o recebimento de indenizações trabalhistas pelos funcionários que perderam seus empregos ou que ficaram encostados. A AERO LB, sociedade com participação indireta da TAP, empresa de aviação portuguesa, da GEOCAPITAL e de investidores brasileiros adquiriu 95% das ações ordinárias da VARIG LOG e 90% das ações ordinárias da VARIG ENGENHARIA E MANUTENÇÃO (VEM). Para quem não se lembra, já na CPI do Mensalão, o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) disse, em seu depoimento, que o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza "esteve três ou quatro vezes com o ex-ministro português Antônio Mexia, em nome de José Dirceu, para negociar a Varig", com o objetivo de estabelecer uma parceria com TAP. Não é que a vontade de Dirceu acabou vindo a prevalecer outra vez?! Foi como tirar “pirulito da mão de criança”.
O fato é que a “concorrência” das companhias “de viagens a baixos custos” acabou por transformar nosso mercado em “bi-monopolizado” pela TAM e pela Gol, o que, evidentemente, vai acabar por colocar os consumidores diante da falta de opções, tanto em termos de qualidade dos serviços prestados como em termos de preço cobrado pelas passagens aéreas. No final das contas, o consumidor terá que pagar o que quer que cobrem as companhias aéreas (e os preços já subiram bastante) e jamais terá de volta as condições mínimas de conforto de que dispunha antes desse festival de preços baixos trazido ao país pelas maravilhas da “livre” concorrência. Vale o ditado: quando a esmola é muita, até o santo desconfia! Nesse caso, porém, todo mundo fingiu que não viu nada!
Segundo dados divulgados (janeiro – 2006) pela Anac a participação de mercado da TAM nos vôos domésticos, que era de 51,6% em novembro, caiu para 49,1%, em dezembro, e a da Gol subiu de 35,2% para 37,1%. Parece que a “estripulia” da TAM, que gerou a “crise” enfrentada pelos passageiros da companhia no final do mês passado, serviu para “equilibrar” melhor a divisão do mercado entre ela e a Gol – que também aumentou o número de oferta de assentos e cresceu 55% em relação a dezembro de 2005. Além das duas, outras aéreas também ganharam participação em dezembro: a BRA finalizou o mês com 4% do mercado (ante 3,16% em novembro) e a Ocean Air com 2,28% (ante 2,1% em novembro).
Agora, imagine o leitor, se, depois de toda essa estratégia de tomada de mercado e de todo o investimento que foi feito nesse sentido, inclusive com a compra de aeronaves e construção de hangares próprios para manutenção das mesmas, uma destas duas companhias tivesse que lidar com o fato de que sua monumental escalada de sucesso empresarial e comercial tivesse sido à custa de uma “controlada” negligência em relação à manutenção de suas aeronaves? Seria o caos. Quem arcaria com um prejuízo moral e financeiro destes?
Um dos piores acidentes da história da aviação, por exemplo, envolvendo um único avião - a queda de um Jumbo 747 da Japan Air Lines, em 1985 -, foi causado por um erro de manutenção que resultou no rompimento da fuselagem em pleno vôo. Alguns anos antes, o avião havia batido com a cauda na pista durante uma decolagem. Uma das partes danificadas - a parede de pressão traseira, que separa a cabine pressurizada, onde ficam os passageiros, da cauda do avião - foi rebitada de forma errada pelos técnicos da Boeing chamados ao Japão e as pressurizações e despressurizações constantes enfraqueceram o remendo, até que ele se rompesse. O ar da cabine saiu em alta velocidade carregando fragmentos que danificaram as tubulações de todos os sistemas hidráulicos e os cabos de comando do leme. O fluido hidráulico vazou até que a aeronave não respondeu mais a nenhum comando do piloto e, depois de vinte minutos de desespero e sofrimento, tripulantes e passageiros viram a morte chegar: voaram em direção a uma montanha, sem ter como desviar.
A colisão com pássaros ou pedras durante a decolagem, e os descuidos freqüentes dos funcionários de aeroportos no momento de encostar as escadas, também provocam riscos e amassados, que, a longo prazo, podem transformar-se em rachaduras. Os mais leves são apenas tratados com anti-corrosivos, mas, em alguns casos, é preciso enxertar novas placas metálicas na fuselagem, em cuja as sucessivas pressurizações e despressurizações causam o aumento rápido de qualquer fissura. Os fabricantes de aviões perceberam isso quando a parte de cima da fuselagem de um velho 737-200 da Aloha Air Lines, companhia aérea do Havaí, simplesmente se rasgou, em pleno ar, deixando o avião como se fosse um carro conversível. Com sangue-frio e muita técnica, o comandante controlou a nave e fez um pouso perfeito no aeroporto de Mauí. Dos 90 passageiros e 5 tripulantes, a única vitima fatal foi uma comissária de bordo, sugada no momento da explosão. Os técnicos concluíram que a explosão foi causada por uma rachadura, que poderia ter sido detectada e consertada se a Aloha tivesse feito a verificação obrigatória da estrutura do avião.
Apesar de atualmente existirem testes estruturais reforçados, quando toda a fuselagem é examinada com atenção, por dentro e por fora, algumas rachaduras são traiçoeiras. Escondidas no interior do metal, elas ficam invisíveis ao olho nu. Para detectá-las, só com os ensaios não-destrutivos, que, geralmente, incluem radiografias e ultra-som. Identificadas, essas rachaduras internas são corrigidas com reforços ou mesmo com a troca de partes inteiras da fuselagem. Esses mesmos testes e reparos são feitos nos pontos particularmente sujeitos a grandes esforços durante o vôo. Os suportes que prendem a turbina à asa, chamados pylons, são os mais críticos. Para as inspeções de pista, os técnicos de manutenção instituíram a pintura de duas marcas vermelhas, uma na carenagem do motor, outra no suporte da asa. Com o pylon em boas condições, as duas marcas ficam alinhadas. Se houver quebra do suporte traseiro - o que, segundo os técnicos, costuma acontecer antes do rompimento total -, a linha pintada na carenagem do motor desce e fica desalinhada em relação à da asa.
Os motores também requerem cuidados especiais. Para assegurar o menor número de falhas possível, eles são submetidos a testes que vão desde uma simples olhadela do mecânico, em busca de penas de pássaros, durante a inspeção de transito, até a desmontagem total. Em alguns aeroportos, como o de Manaus, por exemplo, onde há um depósito de lixo próximo à pista, as turbinas volta e meia ingerem urubus. Apesar de o perigo imediato ser pequeno, o fan, uma peça fundamental da turbina (semelhante a um ventilador), pode sofrer fissuras internas em algumas das palhetas. Se nada for feito, com o tempo, uma palheta danificada pode acabar se quebrando e sendo também ela engolida pelo motor. Neste caso, haverá uma pane grave em pleno vôo.
É de se estranhar, entretanto, que nenhuma destas hipóteses tenha sido levada em consideração nas investigações do acidente com a Boeing 737-800 da Gol que caiu no último dia 29 de setembro - pelo menos que isso seja de conhecimento público. É incrível que como, apesar de a lógica favorecer muitas destas hipóteses acima descritas, antes de privilegiar a de uma inimaginável resistência de um avião de pequeno porte a uma colisão com um Boeing 737, tenha sido esta última a única publicamente considerada pelas autoridades, pelos técnicos, pelos investigadores e pela imprensa – a exceção de uma entrevista concedida ao jornal O Globo pelo ex-secretário da Organização de Aviação Civil Internacional (Oaci) e ex-presidente da Comissão Latino-Americana de Aviação Civil, o major-brigadeiro Renato Costa Pereira, na qual criticava qualquer conclusão apressada sobre o acidente, colocando em dúvida até mesmo o fato de ter havido uma colisão: “Claro, pode ter acontecido. Uma chance em um milhão. O dano sofrido pelo Legacy foi no winglet, que nada mais é do que um aerofólio. Parece-me que não aconteceu nada com a estrutura da asa do Legacy. Tem que me provar que o Boeing caiu por causa disso”.
Além disso, ao contrário do que ficou “desenhado” como sendo a descrição geométrica oficial do acidente,o especialista em investigação de acidentes aéreos e coronel da reserva da Aeronáutica Gustavo Franco Ferreira concluiu que seria necessário ao Legacy estar voando inclinado para a direita e para baixo para justificar as suas avarias, isso partindo-se da premissa de que o Boeing estivesse voando nivelado. Mas, o relatório preliminar do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáutico (Cenipa) - órgão diretamente subordinado ao Estado-Maior da Aeronáutica do Brasil (Emaer) e responsável pelas atividades de investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos - indicou apenas uma única "possibilidade" geométrica para a colisão, admitindo-se, inclusive, que ambas as aeronaves voavam niveladas. Jamais foram divulgadas as “atitudes” das duas aeronaves, isto é, suas latitudes e logitudes, em nem um momento sequer do percurso que as duas faziam.
A insistência desesperada em culpar precipitadamente os pilotos do Legacy pela suposta colisão também é de se estranhar, tanto quanto à recusa das autoridades investigativas em ouvir o depoimento do piloto de uma terceira aeronave que ajudou o Legacy a fazer um pouso de emergência na base aérea da Serra do Cachimbo. Seria tão absurdo assim cogitar a hipótese de que o Boeing da Gol tenha começado a se desintegrar, por qualquer outro motivo, antes, ou mesmo depois, de “cruzar” com o Legacy e que uma de suas partes, desprendida, é que o tenha atingido?
Essa possibilidade deveria, sim, ser considerada. Vejamos. Motivo 1: Três ex-auditores internos da divisão da Boeing em Wichita (Kansas - EUA) acusaram a empresa de utilizar, com total conhecimento, componentes defeituosos procedentes da fornecedora Ducommun. Os ex-auditores asseguram que tais componentes foram e são utilizados, apesar de haver notificações sobre seus defeitos. Uma investigação da revista Mother Jones, com sede em San Francisco (EUA), afirma que as falhas em componentes-chaves ocorreram tanto em jatos fornecidos para a Força Aérea Americana como nos fornecidos a empresas de aviação civil - especialmente para as aeronaves da Boeing da série 737 Next Generation (modelo utilizado pela brasileira Gol) fabricadas entre 1994 e 2001, e nos 747, 757 e 767 fabricados até 2004 (atualmente em operação). Tais componentes são qualificados pela FAA e pelo Pentágono como críticos para a segurança no vôo. Os problemas afetam onze componentes utilizados pela Boeing para construir fuselagens.
Motivo 2: há precedentes recentes de falhas técnicas e de manutenção que provocaram a queda de aviões. Um Boeing 737 da empresa cipriota Helios Airways - única companhia aérea privada de baixo custo do Chipre, criada em 1999 - caiu em 15/8/2005, na Grécia, matando os 121 ocupantes. Segundo informações da equipe de investigação local, a aeronave tinha um histórico de defeitos e reparos no sistema de calefação, o que reforça a tese de que problemas técnicos no sistema de climatização da cabine possam ter causado a queda do avião. No Egito, outro acidente, sobre o qual o governo afirma ter fortes indícios de que uma falha técnica tenha sido a causa - um Boeing 737 da Flash Airlines caiu no Mar Vermelho, em janeiro de 2004, matando todas as 148 pessoas a bordo. O avião tinha apenas dez anos, passava por serviços de manutenção regulares na Noruega e era conduzido por um piloto com mais de 5 mil horas de vôo.
Motivo 3: o ano de 2007 inaugura as estatísticas de desastres aéreos – ainda sem causas definidas – com o desaparecimento, na Indonésia, de um Boeing 737-400 da Adam Airque que seguia de Surabaya, na ilha de Java, para Manado, em Sulawesi, com 96 passageiros e 6 tripulantes. Os acidentes de aviação são freqüentes na Indonésia, onde as companhias aéreas, tanto públicas como privadas, são objeto de críticas por suas carências em termos de segurança, por seus reiterados atrasos ou por sua má administração. A concorrência acaba forçando as companhias a negligenciar a segurança. A Adam Air é uma dessas companhias aéreas de baixo custo muito comuns no arquipélago indonésio. Em 2006, a companhia transportou 7 milhões de passageiros e prevê aumentar esse número para 11 milhões em 2007.
Eu acho que não só já vi esse filme como também já falei sobre ele...
Voltando ao acidente no Brasil. Depois do suposto choque com o Boeing, o Legacy conseguiu pousar em segurança, na base da força aérea na Serra do Cachimbo, apesar das avarias na asa e no estabilizador, com o auxílio de um avião de carga, pilotado por Alexander Cortez, que voava na mesma rota do avião da Gol, vindo de Miami para São Paulo. Cortez ouviu o pedido de socorro feito pelo piloto do Legacy, em inglês, quatro minutos após a suposta colisão. Ele não acredita que o Legacy tenha causado a queda do Boeing. Os pilotos do jato não conseguiram contato com a torre de controle, mas sabiam da existência de um aeroporto na Serra do Cachimbo, embora não tivessem a localização precisa. Cortez conseguiu colocar o Legacy em contato com a torre de controle de Manaus. Mas o piloto e o controlador de vôo não conseguiram se entender. Um não falava português e o outro não falava inglês. Cortez intermediou a conversa e, finalmente, o jatinho conseguiu pousar na base aérea em segurança. O depoimento de Alexander Cortez não foi considerado necessário pelas autoridades brasileiras encarregadas da investigação sobre o acidente, mas, ele foi intimado pelo governo americano para contar o que ouviu nos minutos tensos após a suposta colisão entre os dois aviões.
Segundo o relato de um dos passageiros do Legacy, o jornalista do NYT, Joe Sharkey, naquela noite, os oficiais brasileiros teriam abastecido a tripulação norte-americana com cerveja e comida. A dúvida sobre o que provocou o impacto persistia, e as hipóteses levantadas pelos estrangeiros eram ou a de um balão meteorológico, ou a de um caça ou ainda a de um avião comercial que teria explodido e lançado uma chuva de destroços sobre o Legacy.
O piloto do Legacy, Joseph Lepore, em depoimento à Polícia Federal, disse ter saído da cabine por alguns instantes, para ir ao banheiro, e que, quando retornou, encontrou o co-piloto Jan Paul Paladino tentando falar, sem sucesso, com o controle de tráfego. Em seguida, disse ter ouvido um barulho, mas sem sentir nenhum impacto da colisão, e que o avião desviou para a esquerda. Disse também que um dos cinco passageiros entrou na cabine para avisar que um lado da asa havia sido danificado. Paladino afirmou que os equipamentos do Legacy aparentavam funcionar normalmente, antes e depois do impacto, mas que o sistema anti-colisão não dera nenhum alerta. Lepore e Paladino afirmam, ambos, que o piloto automático do Legacy foi acionado no início do vôo, e que assim teria permanecido até a suposta colisão com o Boeing. O avião, portanto, não teria saído da rota e teria permanecido na mesma altitude durante todo o percurso.
Já está comprovado que os pilotos do Legacy teriam ignorado seu plano de vôo - que estabelecia que a aeronave devesse descer de 37 para 36 mil pés, depois que passasse por Brasília e mudasse o rumo para Manaus. Isso aconteceu, como também está mais do que provado, porque eles receberam autorização da torre de controle de São José dos Campos, de onde o Legacy levantara vôo, para voar na altitude de 37 mil pés até o aeroporto Eduardo Gomes, em Manaus, e não foram corrigidos pela torre de Brasília. Nos registros do Cindacta-1, o último contato do Legacy foi quando a aeronave estava a cerca de sete minutos de Brasília. O piloto Lepore deu o registro do avião, Legacy N600XL, avisou que estava no nível 370 (37 mil pés). O controlador de plantão respondeu, pediu que o piloto apertasse o botão de identificação do vôo – o do transponder. Em seguida, o código apareceu no visor e o controlador informou: "Sob vigilância radar". A afirmação é de praxe e significa que a aeronave estaria sendo monitorada o tempo todo em terra e que, teoricamente, o piloto do Legacy não precisaria mais entrar em contato com a torre, pois, se sua altitude fosse inadequada, ele seria alertado imediatamente pelo rádio.
Mas, ao que tudo indica, o transponder (*) falhou logo após esse episódio. A falta do sistema não faz a aeronave desaparecer da tela do radar, mas há perda na exatidão da altimetria do avião. Portanto, o Cindacta-1 continuava a ver o Legacy por meio do radar primário, que dava a altitude aproximada do jato: entre 35.800 e 36.500 pés - quanto mais longe do radar maior a distorção na tela. Não estaria, portanto, em rota de colisão (os dados de longitude e de latitude não foram divulgados). Mas, o controlador deveria ter levado em conta o que dissera o piloto do Legacy – ou seja, que a aeronave estava voando a 37 mil pés. Como os controladores são substituídos a cada 1 hora e 59 minutos, o militar que monitorava o Legacy passou a missão para o seu substituto, avisando que ele deveria chamar o piloto americano para passar os dados sobre a freqüência da torre de controle de Manaus, porém, sem alertar sobre a altura de navegação que havia sido reportada pelo piloto do Legacy e que não coincidia com a que se lia no radar. O novo controlador tentou, sem sucesso, entrar em contato com o Legacy, conforme registros do Cindacta-1, até que o controle repassou a supervisão do vôo para Manaus, porque o sinal estava ficando muito fraco.
Chamando o Cindacta-4 pelo rádio, o operador de Brasília alertou que o piloto não estava respondendo, mas que o Legacy voava no nível 360 (36 mil pés), conforme determinado no plano de vôo – erro provocado pelo que teria sido a primeira falha de comunicação entre os dois controladores na troca de turno no Cindacta 1. Além dos contatos por rádio, os controladores poderiam ter acionado outras aeronaves próximas para que elas fizessem uma ponte de comunicação com o jato. Isso é um procedimento normal. Por que essa alternativa não foi tentada? Por que o Boeing da Gol não foi alertado sobre uma possível rota de colisão? Poderia ser porque, simplesmente ninguém, além do primeiro controlador do CINDACTA-1 - que havia se comunicado com o piloto do Legacy - sabia que esta aeronave estava voando a 37 mil pés; ou também porque as duas aeronaves estivessem em “pistas” bem distantes e diferentes entre si da mesma aerovia.
Entretanto, no radar de Manaus, se as duas aeronaves já estivessem em rota de colisão, a informação já estaria aparecendo no radar de Manaus, mesmo que as duas estivessem em altitudes supostamente diferentes (considerando-se as coordenadas). Na falta de comunicação com o Legacy, Manaus poderia ter simplesmente dado ordens para que o Boeing da Gol se afastasse alguns graus para o lado. Por que não fizeram isso? A seqüência de erros tão primários chega a levantar suspeitas de que, na realidade, nunca tenha existido perigo nenhum de colisão – o que, mais uma vez, reforça a hipótese de que, por algum motivo ainda não revelado, o Boeing da Gol tenha começado a se desintegrar no ar e a de que o Legacy tenha sido, na verdade (e como antes supunham os pilotos dessa aeronave) atingido por uma das peças que dele se desprenderam.
Os pilotos afirmaram que o rádio da aeronave funcionava bem, o que, de fato, veio a ser comprovado depois da leitura preliminar das caixas-pretas do Legacy, feita na Embraer, por técnicos de São José dos Campos. Eles disseram que os sete chamados feitos pelos controladores, a partir da torre de Brasília, estão registrados. A partir desta informação, simplesmente a Aeronáutica passou a considerar os pilotos americanos responsáveis pelo acidente, porque evidenciaria o fato de que os pilotos teriam abaixado o volume do rádio do Legacy deliberadamente – o que, imediatamente também, diga-se de passagem, nos levaria a concluir que Joseph Lepore e Jan Paladino seriam suicidas, uma vez que, como já foi mencionado, estariam confiando no rádio para que fossem alertados sobre qualquer problema em relação à altitude da aeronave.
Não bate. Logicamente, não bate. Fisicamente, não bate. Matematicamente, não bate. A aerovia UK-6 (Brasília-Manaus) tem 1976 km. Normalmente, o Boeing da Gol, que saiu de Manaus às 15:35h (hora de Brasília), teria chegado à capital às 18:12h – ou seja, em 2:37 horas de vôo. O acidente (a suposta colisão) aconteceu às 16:57h; portanto, depois de 1:22h de vôo. A esta altura, o Boeing estaria em torno do quilômetro “imaginário” 1162 da aerovia (colocando-se, simbolicamente, em Manaus o ponto 0km), se estivesse voando na velocidade de cruzeiro de 850km/h (na verdade, segundo dados das especificações técnicas da aeronave, a velocidade de cruzeiro do 737-800 é de 800km/h, mas os dados do relatório preliminar da comissão que investiga o acidente estabelecem que o Boeing estava a 890km/h – o que o colocaria no quilômetro 1216 da aerovia).
Vindo em sentido contrário, o Legacy havia passado por Brasília trafegando a cerca de 805km/h. Os dados para se calcular esta velocidade são retirados de informações divulgadas pela própria torre de Brasília, segundo a qual o Legacy teria se comunicado com a mesma, pela última vez, mais ou menos há 7 minutos de sobrevoá-la horizontalmente, estando a cerca de 94km da mesma e havia, aproximadamente, 1 hora antes da possível colisão com o Boeing. De acordo com as informações do relatório oficial, entretanto, o Legacy passou por cima da torre de Brasília às 15h55 e voava com velocidade de cerca de 820 km/h. Tudo bem - dados técnicos, dependendo do modelo, dizem que a velocidade máxima do Legacy pode variar entre 830 e 850km/h, mas, então, ao contrário do que foi especificado, ele não estaria a 7 minutos de Brasília no ato da comunicação com a torre.
Às 16:57 (hora do acidente), 1:02h depois de ter passado por Brasília, portanto, o Legacy (indo da marca imaginária 1976km, em Brasília, para 0km, em Manaus) teria alcançado a marca de 1128,67km (1976km – 847,33km (distância em km que a aeronave teria percorrido em 62 minutos, se estivesse a 820km/h)) ou de 1117,67km (se o jatinho estivesse a 850km/h). Para chegar na marca de 1216km onde o Boeing se acidentou, a 820km/h, o Legacy levaria 56 minutos e não 1:02h depois de ter passado por Brasília. O que significaria que uma das duas informações estaria equivocada: ou a da hora do acidente ou a da hora em que o Legacy passou por Brasília. De qualquer forma, por todos os ângulos que se enquadre matematicamente o problema, pelo menos de acordo com as informações divulgadas até o momento, sempre existirá uma diferença (distância) de 3 a 5 minutos entre as duas aeronaves na hora estabelecida com sendo a do acidente.
Isto significa que não se pode afirmar com certeza absoluta que realmente tenha chegado a haver uma colisão entre as duas. Aliás, depois das primeiras análises feitas nas caixas-pretas do Boeing da Gol, a hipótese de não-colisão é alimentada pelo fato de não ter havido uma só palavra por parte dos pilotos do Gol (nem entre si nem com a torre) a respeito de nenhuma anormalidade ou colisão, antes de perderem o contato com a torre de Manaus. Além disso, a análise mostra também que o piloto brasileiro do Boeing da Gol, Décio Chaves Júnior, sintonizou seu rádio, na mesma freqüência usada pelos controladores da capital federal, durante alguns minutos, e chegou a ouvir parte dos chamados feitos pelo centro de controle aéreo de Brasília (Cindacta-1) ao jato Legacy. Por que não teria ele mesmo tentado fazer um contato ou com a torre ou com o Legacy, como o fez, já depois do acidente, o piloto do avião de carga que ajudou o Legacy a conseguir pousar na base aérea da Serra do Cachimbo? Talvez o comandante Décio não tivesse dado atenção às tentativas de contato da torre com o Legacy por não ter identificado nenhum tom de emergência. De qualquer forma, essa é mais uma das perguntas que, muito provavelmente, permanecerá sem resposta.
Essa dúvida ficará por que o cilindro de voz da caixa preta do avião da Gol foi encontrado, segundo divulgado pela Aeronáutica, com avarias. Informação que contradiz o que antes teria sido divulgado pela própria Força Aérea – a de que estaria em perfeito estado. Diga-se de passagem, há mais mistérios envolvendo a caixa-preta do Boeing. No dia 2 de outubro de 2006, a FAB informou que os equipamentos de "gravação de voz na cabine" (cockpit voice recorder, CVR) e de "gravação digital de dados de vôo" (digital flight data recorder, FDR) do Boeing haviam sido encontrados e encaminhados à comissão de investigação. Entretanto, em 13 de outubro, nova nota da FAB informova que o cilindro contendo os registros de voz da cabine (CVR) ainda não havia sido encontrado. Depois, no dia 24 de outubro, o gravador de voz foi estranha e finalmente encontrado enterrado no solo a uma profundidade de aproximadamente vinte centímetros. Não houve a preocupação em divulgar onde havia sido encontrada nem a primeira parte da caixa preta, anteriormente, nem onde foi encontrado o cilindro de voz posteriormente, para que se pudesse conjecturar sobre eventuais possibilidades. Na verdade, o modelo de cilindro (que foi fotografado e divulgado) pertenceria a uma estrutura maior (que compõe a caixa preta) que nunca foi mostrada para provar que este tivesse de desgarrado da mesma.
Ora, se a Copa vai bem, a Gol tende a seguir seus passos, mesmo que seja tecnicamente absorvida por ela, já que existe uma aliança comercial entre as duas companhias aéreas, desde agosto de 2005, para expandir a capacidade de ação pela América Latina. A Copa tem várias outras lucrativas alianças. Uma delas é com a Continental Airlines - a sétima maior empresa aérea do mundo, que transporta, aproximadamente, 41 milhões de passageiros por ano, na mais moderna frota de jatos dos Estados Unidos. A Copa também tem alianças com a Continental Connection - a quinta empresa aérea regional dos Estados Unidos -, operada pela Gulfstream International Airlines; com a Northwest Airlines - a quarta maior empresa aérea do mundo, oferecendo vôos para 750 cidades em 120 países nos seis continentes; e com a Mexicana de Aviación - uma empresa aérea internacional que atende a 55 destinos na América do Norte, Central, América do Sul e Caribe. Portanto, a Gol toma parte em um conglomerado de empresas aéreas bem-sucedidas internacionalmente.
A companhia brasileira, que se nomeia de Linhas Aéreas Inteligentes, foi concebida como uma companhia aérea de “baixo-custo – baixa-tarifa” (Aqui, TODOS podem voar! - dizia o slogan). A concepção sempre prometeu muitos lucros, operando uma frota simplificada, com classe única de serviços, baixos custos para manutenção, para combustível e para treinamento. As ações da GOL estão listadas na NYSE e na Bovespa desde Junho de 2004. Desconforto e escassez de serviços de bordo é ao que os passageiros se submetem em troca de passagens mais baratas. É o conceito de “gado-humano” da globalização, transportado e traduzido pela indústria de transportes aéreos de passageiros.
É obvio que, com a cada vez mais mundialmente acentuada concentração de renda e com o empobrecimento generalizado das chamadas classes médias, a corrida a este tipo de “solução” para locomoções rápidas entre grandes distâncias acabaria por quebrar com quaisquer outras companhias aéreas concorrentes que não acabassem por se igualar em termos de serviços e de preços oferecidos. Resultado: cartelização, monopolização, baixos custos, empregados sujeitos a salários mais baixos, poucos serviços oferecidos aos passageiros e muitos lucros obtidos pelas companhias aéreas. Isso, caros leitores, está muito longe de ser o que sempre foi concebido como livre concorrência de mercado. É plano infalível de monopolização. E o fenômeno é mundial.
Aqui no Brasil, assessorado por Daniel Mandelli Martin, ex-presidente da Tam, o ex-deputado e ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu, desde que estava oficialmente na ativa, planejava reestruturar a complicada aviação comercial brasileira, deixando a Vasp minguar e direcionando a Varig apenas para vôos internacionais. As rotas internas seriam divididas entre a Tam e a Gol, com uma certa vantagem para a primeira. Não foi coincidência a compra de um Airbus 319 para a Presidência da República, já que a Tam é representante da Airbus no Brasil. Não é que, hoje, “no frigir dos ovos”, as coisas todas caminharam como Dirceu planejara?
A Transbrasil, que tem (ou tinha) como advogado o compadre do presidente Lula, Roberto Teixeira, recebeu do governo perto de R$ 400 milhões em ajuda (para Varig, não deu) e o casal dono da companhia, Marise e Antonio Celso Cipriani, saiu ileso da CPI do Banestado, cujo relatório sugeria que ambos fossem investigados pelo Ministério Público. Coincidentemente, foi no ano do desaparecimento da Transbrasil que surgiu a Gol, inicialmente com uma frota de apenas 5 aviões distribuídos em rotas diversas e estratégicas pelo país. Em 5 anos a empresa agigantou-se inimaginavelmente. Coincidência mais conveniente essa!
A VASP, apesar de ter sobrevivido até 2005, já passava por uma grave crise financeira e acabou por desaparecer. Restava, além da TAM e da emergente Gol, a Varig. A empresa não conseguiu ajuda do governo (que devia à Varig cerca de R$ 2 bilhões) e não teve sua falência decretada, o que acabou dificultando o recebimento de indenizações trabalhistas pelos funcionários que perderam seus empregos ou que ficaram encostados. A AERO LB, sociedade com participação indireta da TAP, empresa de aviação portuguesa, da GEOCAPITAL e de investidores brasileiros adquiriu 95% das ações ordinárias da VARIG LOG e 90% das ações ordinárias da VARIG ENGENHARIA E MANUTENÇÃO (VEM). Para quem não se lembra, já na CPI do Mensalão, o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) disse, em seu depoimento, que o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza "esteve três ou quatro vezes com o ex-ministro português Antônio Mexia, em nome de José Dirceu, para negociar a Varig", com o objetivo de estabelecer uma parceria com TAP. Não é que a vontade de Dirceu acabou vindo a prevalecer outra vez?! Foi como tirar “pirulito da mão de criança”.
O fato é que a “concorrência” das companhias “de viagens a baixos custos” acabou por transformar nosso mercado em “bi-monopolizado” pela TAM e pela Gol, o que, evidentemente, vai acabar por colocar os consumidores diante da falta de opções, tanto em termos de qualidade dos serviços prestados como em termos de preço cobrado pelas passagens aéreas. No final das contas, o consumidor terá que pagar o que quer que cobrem as companhias aéreas (e os preços já subiram bastante) e jamais terá de volta as condições mínimas de conforto de que dispunha antes desse festival de preços baixos trazido ao país pelas maravilhas da “livre” concorrência. Vale o ditado: quando a esmola é muita, até o santo desconfia! Nesse caso, porém, todo mundo fingiu que não viu nada!
Segundo dados divulgados (janeiro – 2006) pela Anac a participação de mercado da TAM nos vôos domésticos, que era de 51,6% em novembro, caiu para 49,1%, em dezembro, e a da Gol subiu de 35,2% para 37,1%. Parece que a “estripulia” da TAM, que gerou a “crise” enfrentada pelos passageiros da companhia no final do mês passado, serviu para “equilibrar” melhor a divisão do mercado entre ela e a Gol – que também aumentou o número de oferta de assentos e cresceu 55% em relação a dezembro de 2005. Além das duas, outras aéreas também ganharam participação em dezembro: a BRA finalizou o mês com 4% do mercado (ante 3,16% em novembro) e a Ocean Air com 2,28% (ante 2,1% em novembro).
Agora, imagine o leitor, se, depois de toda essa estratégia de tomada de mercado e de todo o investimento que foi feito nesse sentido, inclusive com a compra de aeronaves e construção de hangares próprios para manutenção das mesmas, uma destas duas companhias tivesse que lidar com o fato de que sua monumental escalada de sucesso empresarial e comercial tivesse sido à custa de uma “controlada” negligência em relação à manutenção de suas aeronaves? Seria o caos. Quem arcaria com um prejuízo moral e financeiro destes?
Um dos piores acidentes da história da aviação, por exemplo, envolvendo um único avião - a queda de um Jumbo 747 da Japan Air Lines, em 1985 -, foi causado por um erro de manutenção que resultou no rompimento da fuselagem em pleno vôo. Alguns anos antes, o avião havia batido com a cauda na pista durante uma decolagem. Uma das partes danificadas - a parede de pressão traseira, que separa a cabine pressurizada, onde ficam os passageiros, da cauda do avião - foi rebitada de forma errada pelos técnicos da Boeing chamados ao Japão e as pressurizações e despressurizações constantes enfraqueceram o remendo, até que ele se rompesse. O ar da cabine saiu em alta velocidade carregando fragmentos que danificaram as tubulações de todos os sistemas hidráulicos e os cabos de comando do leme. O fluido hidráulico vazou até que a aeronave não respondeu mais a nenhum comando do piloto e, depois de vinte minutos de desespero e sofrimento, tripulantes e passageiros viram a morte chegar: voaram em direção a uma montanha, sem ter como desviar.
A colisão com pássaros ou pedras durante a decolagem, e os descuidos freqüentes dos funcionários de aeroportos no momento de encostar as escadas, também provocam riscos e amassados, que, a longo prazo, podem transformar-se em rachaduras. Os mais leves são apenas tratados com anti-corrosivos, mas, em alguns casos, é preciso enxertar novas placas metálicas na fuselagem, em cuja as sucessivas pressurizações e despressurizações causam o aumento rápido de qualquer fissura. Os fabricantes de aviões perceberam isso quando a parte de cima da fuselagem de um velho 737-200 da Aloha Air Lines, companhia aérea do Havaí, simplesmente se rasgou, em pleno ar, deixando o avião como se fosse um carro conversível. Com sangue-frio e muita técnica, o comandante controlou a nave e fez um pouso perfeito no aeroporto de Mauí. Dos 90 passageiros e 5 tripulantes, a única vitima fatal foi uma comissária de bordo, sugada no momento da explosão. Os técnicos concluíram que a explosão foi causada por uma rachadura, que poderia ter sido detectada e consertada se a Aloha tivesse feito a verificação obrigatória da estrutura do avião.
Apesar de atualmente existirem testes estruturais reforçados, quando toda a fuselagem é examinada com atenção, por dentro e por fora, algumas rachaduras são traiçoeiras. Escondidas no interior do metal, elas ficam invisíveis ao olho nu. Para detectá-las, só com os ensaios não-destrutivos, que, geralmente, incluem radiografias e ultra-som. Identificadas, essas rachaduras internas são corrigidas com reforços ou mesmo com a troca de partes inteiras da fuselagem. Esses mesmos testes e reparos são feitos nos pontos particularmente sujeitos a grandes esforços durante o vôo. Os suportes que prendem a turbina à asa, chamados pylons, são os mais críticos. Para as inspeções de pista, os técnicos de manutenção instituíram a pintura de duas marcas vermelhas, uma na carenagem do motor, outra no suporte da asa. Com o pylon em boas condições, as duas marcas ficam alinhadas. Se houver quebra do suporte traseiro - o que, segundo os técnicos, costuma acontecer antes do rompimento total -, a linha pintada na carenagem do motor desce e fica desalinhada em relação à da asa.
Os motores também requerem cuidados especiais. Para assegurar o menor número de falhas possível, eles são submetidos a testes que vão desde uma simples olhadela do mecânico, em busca de penas de pássaros, durante a inspeção de transito, até a desmontagem total. Em alguns aeroportos, como o de Manaus, por exemplo, onde há um depósito de lixo próximo à pista, as turbinas volta e meia ingerem urubus. Apesar de o perigo imediato ser pequeno, o fan, uma peça fundamental da turbina (semelhante a um ventilador), pode sofrer fissuras internas em algumas das palhetas. Se nada for feito, com o tempo, uma palheta danificada pode acabar se quebrando e sendo também ela engolida pelo motor. Neste caso, haverá uma pane grave em pleno vôo.
É de se estranhar, entretanto, que nenhuma destas hipóteses tenha sido levada em consideração nas investigações do acidente com a Boeing 737-800 da Gol que caiu no último dia 29 de setembro - pelo menos que isso seja de conhecimento público. É incrível que como, apesar de a lógica favorecer muitas destas hipóteses acima descritas, antes de privilegiar a de uma inimaginável resistência de um avião de pequeno porte a uma colisão com um Boeing 737, tenha sido esta última a única publicamente considerada pelas autoridades, pelos técnicos, pelos investigadores e pela imprensa – a exceção de uma entrevista concedida ao jornal O Globo pelo ex-secretário da Organização de Aviação Civil Internacional (Oaci) e ex-presidente da Comissão Latino-Americana de Aviação Civil, o major-brigadeiro Renato Costa Pereira, na qual criticava qualquer conclusão apressada sobre o acidente, colocando em dúvida até mesmo o fato de ter havido uma colisão: “Claro, pode ter acontecido. Uma chance em um milhão. O dano sofrido pelo Legacy foi no winglet, que nada mais é do que um aerofólio. Parece-me que não aconteceu nada com a estrutura da asa do Legacy. Tem que me provar que o Boeing caiu por causa disso”.
Além disso, ao contrário do que ficou “desenhado” como sendo a descrição geométrica oficial do acidente,o especialista em investigação de acidentes aéreos e coronel da reserva da Aeronáutica Gustavo Franco Ferreira concluiu que seria necessário ao Legacy estar voando inclinado para a direita e para baixo para justificar as suas avarias, isso partindo-se da premissa de que o Boeing estivesse voando nivelado. Mas, o relatório preliminar do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáutico (Cenipa) - órgão diretamente subordinado ao Estado-Maior da Aeronáutica do Brasil (Emaer) e responsável pelas atividades de investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos - indicou apenas uma única "possibilidade" geométrica para a colisão, admitindo-se, inclusive, que ambas as aeronaves voavam niveladas. Jamais foram divulgadas as “atitudes” das duas aeronaves, isto é, suas latitudes e logitudes, em nem um momento sequer do percurso que as duas faziam.
A insistência desesperada em culpar precipitadamente os pilotos do Legacy pela suposta colisão também é de se estranhar, tanto quanto à recusa das autoridades investigativas em ouvir o depoimento do piloto de uma terceira aeronave que ajudou o Legacy a fazer um pouso de emergência na base aérea da Serra do Cachimbo. Seria tão absurdo assim cogitar a hipótese de que o Boeing da Gol tenha começado a se desintegrar, por qualquer outro motivo, antes, ou mesmo depois, de “cruzar” com o Legacy e que uma de suas partes, desprendida, é que o tenha atingido?
Essa possibilidade deveria, sim, ser considerada. Vejamos. Motivo 1: Três ex-auditores internos da divisão da Boeing em Wichita (Kansas - EUA) acusaram a empresa de utilizar, com total conhecimento, componentes defeituosos procedentes da fornecedora Ducommun. Os ex-auditores asseguram que tais componentes foram e são utilizados, apesar de haver notificações sobre seus defeitos. Uma investigação da revista Mother Jones, com sede em San Francisco (EUA), afirma que as falhas em componentes-chaves ocorreram tanto em jatos fornecidos para a Força Aérea Americana como nos fornecidos a empresas de aviação civil - especialmente para as aeronaves da Boeing da série 737 Next Generation (modelo utilizado pela brasileira Gol) fabricadas entre 1994 e 2001, e nos 747, 757 e 767 fabricados até 2004 (atualmente em operação). Tais componentes são qualificados pela FAA e pelo Pentágono como críticos para a segurança no vôo. Os problemas afetam onze componentes utilizados pela Boeing para construir fuselagens.
Motivo 2: há precedentes recentes de falhas técnicas e de manutenção que provocaram a queda de aviões. Um Boeing 737 da empresa cipriota Helios Airways - única companhia aérea privada de baixo custo do Chipre, criada em 1999 - caiu em 15/8/2005, na Grécia, matando os 121 ocupantes. Segundo informações da equipe de investigação local, a aeronave tinha um histórico de defeitos e reparos no sistema de calefação, o que reforça a tese de que problemas técnicos no sistema de climatização da cabine possam ter causado a queda do avião. No Egito, outro acidente, sobre o qual o governo afirma ter fortes indícios de que uma falha técnica tenha sido a causa - um Boeing 737 da Flash Airlines caiu no Mar Vermelho, em janeiro de 2004, matando todas as 148 pessoas a bordo. O avião tinha apenas dez anos, passava por serviços de manutenção regulares na Noruega e era conduzido por um piloto com mais de 5 mil horas de vôo.
Motivo 3: o ano de 2007 inaugura as estatísticas de desastres aéreos – ainda sem causas definidas – com o desaparecimento, na Indonésia, de um Boeing 737-400 da Adam Airque que seguia de Surabaya, na ilha de Java, para Manado, em Sulawesi, com 96 passageiros e 6 tripulantes. Os acidentes de aviação são freqüentes na Indonésia, onde as companhias aéreas, tanto públicas como privadas, são objeto de críticas por suas carências em termos de segurança, por seus reiterados atrasos ou por sua má administração. A concorrência acaba forçando as companhias a negligenciar a segurança. A Adam Air é uma dessas companhias aéreas de baixo custo muito comuns no arquipélago indonésio. Em 2006, a companhia transportou 7 milhões de passageiros e prevê aumentar esse número para 11 milhões em 2007.
Eu acho que não só já vi esse filme como também já falei sobre ele...
Voltando ao acidente no Brasil. Depois do suposto choque com o Boeing, o Legacy conseguiu pousar em segurança, na base da força aérea na Serra do Cachimbo, apesar das avarias na asa e no estabilizador, com o auxílio de um avião de carga, pilotado por Alexander Cortez, que voava na mesma rota do avião da Gol, vindo de Miami para São Paulo. Cortez ouviu o pedido de socorro feito pelo piloto do Legacy, em inglês, quatro minutos após a suposta colisão. Ele não acredita que o Legacy tenha causado a queda do Boeing. Os pilotos do jato não conseguiram contato com a torre de controle, mas sabiam da existência de um aeroporto na Serra do Cachimbo, embora não tivessem a localização precisa. Cortez conseguiu colocar o Legacy em contato com a torre de controle de Manaus. Mas o piloto e o controlador de vôo não conseguiram se entender. Um não falava português e o outro não falava inglês. Cortez intermediou a conversa e, finalmente, o jatinho conseguiu pousar na base aérea em segurança. O depoimento de Alexander Cortez não foi considerado necessário pelas autoridades brasileiras encarregadas da investigação sobre o acidente, mas, ele foi intimado pelo governo americano para contar o que ouviu nos minutos tensos após a suposta colisão entre os dois aviões.
Segundo o relato de um dos passageiros do Legacy, o jornalista do NYT, Joe Sharkey, naquela noite, os oficiais brasileiros teriam abastecido a tripulação norte-americana com cerveja e comida. A dúvida sobre o que provocou o impacto persistia, e as hipóteses levantadas pelos estrangeiros eram ou a de um balão meteorológico, ou a de um caça ou ainda a de um avião comercial que teria explodido e lançado uma chuva de destroços sobre o Legacy.
O piloto do Legacy, Joseph Lepore, em depoimento à Polícia Federal, disse ter saído da cabine por alguns instantes, para ir ao banheiro, e que, quando retornou, encontrou o co-piloto Jan Paul Paladino tentando falar, sem sucesso, com o controle de tráfego. Em seguida, disse ter ouvido um barulho, mas sem sentir nenhum impacto da colisão, e que o avião desviou para a esquerda. Disse também que um dos cinco passageiros entrou na cabine para avisar que um lado da asa havia sido danificado. Paladino afirmou que os equipamentos do Legacy aparentavam funcionar normalmente, antes e depois do impacto, mas que o sistema anti-colisão não dera nenhum alerta. Lepore e Paladino afirmam, ambos, que o piloto automático do Legacy foi acionado no início do vôo, e que assim teria permanecido até a suposta colisão com o Boeing. O avião, portanto, não teria saído da rota e teria permanecido na mesma altitude durante todo o percurso.
Já está comprovado que os pilotos do Legacy teriam ignorado seu plano de vôo - que estabelecia que a aeronave devesse descer de 37 para 36 mil pés, depois que passasse por Brasília e mudasse o rumo para Manaus. Isso aconteceu, como também está mais do que provado, porque eles receberam autorização da torre de controle de São José dos Campos, de onde o Legacy levantara vôo, para voar na altitude de 37 mil pés até o aeroporto Eduardo Gomes, em Manaus, e não foram corrigidos pela torre de Brasília. Nos registros do Cindacta-1, o último contato do Legacy foi quando a aeronave estava a cerca de sete minutos de Brasília. O piloto Lepore deu o registro do avião, Legacy N600XL, avisou que estava no nível 370 (37 mil pés). O controlador de plantão respondeu, pediu que o piloto apertasse o botão de identificação do vôo – o do transponder. Em seguida, o código apareceu no visor e o controlador informou: "Sob vigilância radar". A afirmação é de praxe e significa que a aeronave estaria sendo monitorada o tempo todo em terra e que, teoricamente, o piloto do Legacy não precisaria mais entrar em contato com a torre, pois, se sua altitude fosse inadequada, ele seria alertado imediatamente pelo rádio.
Mas, ao que tudo indica, o transponder (*) falhou logo após esse episódio. A falta do sistema não faz a aeronave desaparecer da tela do radar, mas há perda na exatidão da altimetria do avião. Portanto, o Cindacta-1 continuava a ver o Legacy por meio do radar primário, que dava a altitude aproximada do jato: entre 35.800 e 36.500 pés - quanto mais longe do radar maior a distorção na tela. Não estaria, portanto, em rota de colisão (os dados de longitude e de latitude não foram divulgados). Mas, o controlador deveria ter levado em conta o que dissera o piloto do Legacy – ou seja, que a aeronave estava voando a 37 mil pés. Como os controladores são substituídos a cada 1 hora e 59 minutos, o militar que monitorava o Legacy passou a missão para o seu substituto, avisando que ele deveria chamar o piloto americano para passar os dados sobre a freqüência da torre de controle de Manaus, porém, sem alertar sobre a altura de navegação que havia sido reportada pelo piloto do Legacy e que não coincidia com a que se lia no radar. O novo controlador tentou, sem sucesso, entrar em contato com o Legacy, conforme registros do Cindacta-1, até que o controle repassou a supervisão do vôo para Manaus, porque o sinal estava ficando muito fraco.
Chamando o Cindacta-4 pelo rádio, o operador de Brasília alertou que o piloto não estava respondendo, mas que o Legacy voava no nível 360 (36 mil pés), conforme determinado no plano de vôo – erro provocado pelo que teria sido a primeira falha de comunicação entre os dois controladores na troca de turno no Cindacta 1. Além dos contatos por rádio, os controladores poderiam ter acionado outras aeronaves próximas para que elas fizessem uma ponte de comunicação com o jato. Isso é um procedimento normal. Por que essa alternativa não foi tentada? Por que o Boeing da Gol não foi alertado sobre uma possível rota de colisão? Poderia ser porque, simplesmente ninguém, além do primeiro controlador do CINDACTA-1 - que havia se comunicado com o piloto do Legacy - sabia que esta aeronave estava voando a 37 mil pés; ou também porque as duas aeronaves estivessem em “pistas” bem distantes e diferentes entre si da mesma aerovia.
Entretanto, no radar de Manaus, se as duas aeronaves já estivessem em rota de colisão, a informação já estaria aparecendo no radar de Manaus, mesmo que as duas estivessem em altitudes supostamente diferentes (considerando-se as coordenadas). Na falta de comunicação com o Legacy, Manaus poderia ter simplesmente dado ordens para que o Boeing da Gol se afastasse alguns graus para o lado. Por que não fizeram isso? A seqüência de erros tão primários chega a levantar suspeitas de que, na realidade, nunca tenha existido perigo nenhum de colisão – o que, mais uma vez, reforça a hipótese de que, por algum motivo ainda não revelado, o Boeing da Gol tenha começado a se desintegrar no ar e a de que o Legacy tenha sido, na verdade (e como antes supunham os pilotos dessa aeronave) atingido por uma das peças que dele se desprenderam.
Os pilotos afirmaram que o rádio da aeronave funcionava bem, o que, de fato, veio a ser comprovado depois da leitura preliminar das caixas-pretas do Legacy, feita na Embraer, por técnicos de São José dos Campos. Eles disseram que os sete chamados feitos pelos controladores, a partir da torre de Brasília, estão registrados. A partir desta informação, simplesmente a Aeronáutica passou a considerar os pilotos americanos responsáveis pelo acidente, porque evidenciaria o fato de que os pilotos teriam abaixado o volume do rádio do Legacy deliberadamente – o que, imediatamente também, diga-se de passagem, nos levaria a concluir que Joseph Lepore e Jan Paladino seriam suicidas, uma vez que, como já foi mencionado, estariam confiando no rádio para que fossem alertados sobre qualquer problema em relação à altitude da aeronave.
Não bate. Logicamente, não bate. Fisicamente, não bate. Matematicamente, não bate. A aerovia UK-6 (Brasília-Manaus) tem 1976 km. Normalmente, o Boeing da Gol, que saiu de Manaus às 15:35h (hora de Brasília), teria chegado à capital às 18:12h – ou seja, em 2:37 horas de vôo. O acidente (a suposta colisão) aconteceu às 16:57h; portanto, depois de 1:22h de vôo. A esta altura, o Boeing estaria em torno do quilômetro “imaginário” 1162 da aerovia (colocando-se, simbolicamente, em Manaus o ponto 0km), se estivesse voando na velocidade de cruzeiro de 850km/h (na verdade, segundo dados das especificações técnicas da aeronave, a velocidade de cruzeiro do 737-800 é de 800km/h, mas os dados do relatório preliminar da comissão que investiga o acidente estabelecem que o Boeing estava a 890km/h – o que o colocaria no quilômetro 1216 da aerovia).
Vindo em sentido contrário, o Legacy havia passado por Brasília trafegando a cerca de 805km/h. Os dados para se calcular esta velocidade são retirados de informações divulgadas pela própria torre de Brasília, segundo a qual o Legacy teria se comunicado com a mesma, pela última vez, mais ou menos há 7 minutos de sobrevoá-la horizontalmente, estando a cerca de 94km da mesma e havia, aproximadamente, 1 hora antes da possível colisão com o Boeing. De acordo com as informações do relatório oficial, entretanto, o Legacy passou por cima da torre de Brasília às 15h55 e voava com velocidade de cerca de 820 km/h. Tudo bem - dados técnicos, dependendo do modelo, dizem que a velocidade máxima do Legacy pode variar entre 830 e 850km/h, mas, então, ao contrário do que foi especificado, ele não estaria a 7 minutos de Brasília no ato da comunicação com a torre.
Às 16:57 (hora do acidente), 1:02h depois de ter passado por Brasília, portanto, o Legacy (indo da marca imaginária 1976km, em Brasília, para 0km, em Manaus) teria alcançado a marca de 1128,67km (1976km – 847,33km (distância em km que a aeronave teria percorrido em 62 minutos, se estivesse a 820km/h)) ou de 1117,67km (se o jatinho estivesse a 850km/h). Para chegar na marca de 1216km onde o Boeing se acidentou, a 820km/h, o Legacy levaria 56 minutos e não 1:02h depois de ter passado por Brasília. O que significaria que uma das duas informações estaria equivocada: ou a da hora do acidente ou a da hora em que o Legacy passou por Brasília. De qualquer forma, por todos os ângulos que se enquadre matematicamente o problema, pelo menos de acordo com as informações divulgadas até o momento, sempre existirá uma diferença (distância) de 3 a 5 minutos entre as duas aeronaves na hora estabelecida com sendo a do acidente.
Isto significa que não se pode afirmar com certeza absoluta que realmente tenha chegado a haver uma colisão entre as duas. Aliás, depois das primeiras análises feitas nas caixas-pretas do Boeing da Gol, a hipótese de não-colisão é alimentada pelo fato de não ter havido uma só palavra por parte dos pilotos do Gol (nem entre si nem com a torre) a respeito de nenhuma anormalidade ou colisão, antes de perderem o contato com a torre de Manaus. Além disso, a análise mostra também que o piloto brasileiro do Boeing da Gol, Décio Chaves Júnior, sintonizou seu rádio, na mesma freqüência usada pelos controladores da capital federal, durante alguns minutos, e chegou a ouvir parte dos chamados feitos pelo centro de controle aéreo de Brasília (Cindacta-1) ao jato Legacy. Por que não teria ele mesmo tentado fazer um contato ou com a torre ou com o Legacy, como o fez, já depois do acidente, o piloto do avião de carga que ajudou o Legacy a conseguir pousar na base aérea da Serra do Cachimbo? Talvez o comandante Décio não tivesse dado atenção às tentativas de contato da torre com o Legacy por não ter identificado nenhum tom de emergência. De qualquer forma, essa é mais uma das perguntas que, muito provavelmente, permanecerá sem resposta.
Essa dúvida ficará por que o cilindro de voz da caixa preta do avião da Gol foi encontrado, segundo divulgado pela Aeronáutica, com avarias. Informação que contradiz o que antes teria sido divulgado pela própria Força Aérea – a de que estaria em perfeito estado. Diga-se de passagem, há mais mistérios envolvendo a caixa-preta do Boeing. No dia 2 de outubro de 2006, a FAB informou que os equipamentos de "gravação de voz na cabine" (cockpit voice recorder, CVR) e de "gravação digital de dados de vôo" (digital flight data recorder, FDR) do Boeing haviam sido encontrados e encaminhados à comissão de investigação. Entretanto, em 13 de outubro, nova nota da FAB informova que o cilindro contendo os registros de voz da cabine (CVR) ainda não havia sido encontrado. Depois, no dia 24 de outubro, o gravador de voz foi estranha e finalmente encontrado enterrado no solo a uma profundidade de aproximadamente vinte centímetros. Não houve a preocupação em divulgar onde havia sido encontrada nem a primeira parte da caixa preta, anteriormente, nem onde foi encontrado o cilindro de voz posteriormente, para que se pudesse conjecturar sobre eventuais possibilidades. Na verdade, o modelo de cilindro (que foi fotografado e divulgado) pertenceria a uma estrutura maior (que compõe a caixa preta) que nunca foi mostrada para provar que este tivesse de desgarrado da mesma.
Além do mais, em todos os relatos de colisão entre uma aeronave de grande porte e outra de médio ou de pequeno porte, em pleno vôo e fora da área de aproximação para pouso, não há um só que registre a resistência dos aviões menores nem a sobrevivência de seus passageiros. Se isso aconteceu no acidente que envolveu o Legacy e o Boeing da Gol, foi o primeiro da história da aviação.
Em 1973, por exemplo, um DC-9 da Spanish Airlines e um Coronado 990 fretado na Espanha, dois aviões de passageiros de grande porte, colidiram sobre o espaço aéreo controlado pela França, durante uma greve dos controladores de tráfego aéreo franceses. O DC-9 explodiu no ar e o Coronado conseguiu pousar sem registrar vítimas fatais. O erro foi do controle de tráfego aéreo e todos os controladores foram sumariamente demitidos por ordem direta do presidente francês.
Em setembro de 1976, um Hawker-Siddeley Trident da British Airways (vôo BA475) e um Douglas DC-9 da Inex Adria Aviopromet colidiram sobre o espaço aéreo de Zagreb, então Iugoslávia. Um erro cometido pela equipe de controladores de vôo – entre os quais o de se comunicar em língua servo-croata, ao invés de em inglês – provocou o acidente. Nesse caso, a asa esquerda do DC-9 atingiu a cabine de comando do HS-121 Trident, que começou a desintegrar-se no ar, e caiu. O DC-9, sem a asa esquerda, também caiu. Morreram todos os 176 ocupantes das duas aeronaves – 103 no DC-9 e 63 no Trident. Todos os controladores que estavam de serviço foram presos. Somente, um deles, entretanto, foi considerado culpado e condenado a 7 anos de prisão – mas, na verdade, acabou ficando somente 2 anos na cadeia. Em setembro de 1978, um Boeing 727-214 da Pacific Southwest Airlines colidiu com um Cessna 172, sobre uma área residencial de San Diego (Califórnia, EUA). Morreram 137 pessoas: os ocupantes das duas aeronaves e mais 7 pessoas que estavam em terra. O tempo estava bom e a visibilidade era de 10 milhas. Os dois aviões sabiam da presença um do outro e que ambos estariam na mesma direção, em aproximação para a via aérea 27. Entretanto, a torre de controle aéreo pediu ao piloto do Boeing que controlasse a aproximação do Cessna visualmente. Não deu certo. Conclusão da investigação: errou o piloto em acatar apenas este procedimento e a torre em assim proceder, quando poderia ter determinado o afastamento lateral das duas aeronaves.
Mais recentemente, em 2002, um Boeing 757-200 e um Tupolev Tu-154M colidiram sobre o espaço aéreo controlado pela Alemanha. Ambos os aviões estavam em perfeito estado e ambos os pilotos eram experientes. As duas aeronaves dispunham do mais moderno sistema anti-colisão – TCASII. Os dois sistemas funcionaram perfeitamente e não só dispararam os alertas de rota de colisão como determinaram qual seria o procedimento de desvio – que o Boeing descesse e que o Tupolev subisse. Entretanto, um comando da torre determinou que o Tupolev também descesse. Nesses casos, quando há um conflito entre o que diz o equipamento de segurança e as ordens recebidas pela torre, seguir um ou outro procedimento recomendado está sob a responsabilidade total do piloto. O piloto resolveu seguir as ordens da torre e o acidente ocorreu. As investigações deste caso deixaram muitas perguntas sem resposta. Não houve sobreviventes.
Muito dinheiro. Muito dinheiro pode ser a causa de tanto mistério que envolve o acidente entre o Legacy e o Boeing da Gol e a recusa em se considerar outras hipóteses além da colisão entre as duas aeronaves. A culpa foi sendo jogada de “colo em colo”, até que o embaralhamento de informações se tornasse tão grande que não haveria mais a possibilidade de se raciocinar com clareza a respeito do acidente – mentiras, desmentidos, informações truncadas, tudo isso provoca nas pessoas uma desesperança em saber a verdade e, ao mesmo tempo, uma tendência no cérebro delas a considerar como verdade aquilo que for mais repetido. Coisas simples como atitude das duas aeronaves, conteúdo da caixa-preta de voz do Gol, relatório da última inspeção de manutenção do Gol - nada disso foi divulgado. Enquanto isso não acontecer, integral e corretamente (se é que se possa aventar esta possibilidade), tudo pode ser cogitado.
À medida que os fatos fossem sendo divulgados e “esclarecidos”, era de se prever que a culpa pelo acidente certamente migraria dos pilotos do Legacy para os controladores de vôo. Isso acabou gerando toda a crise que, de repente, tomou conta de um setor que sempre havia sido um exemplo de eficiência, até começar a ser lentamente destruído. Crise essa que, pelas condições em que se encontrava o setor, por causa da negligência do governo ao não repassar verbas que seriam devidas e ao transformar o DAC em Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e esta em cabide de empregos da militância partidária, acabaria por eclodir, mais cedo ou mais tarde, com ou sem acidente. Aliás, há bastante interesse do partido latino-americano que nos governa em retirar dos militares mais esta condição de controle – enquanto ainda não cooptaram todos eles para a causa da nação latino-americana contra o império capitalista norte-americano, é claro.
De repente, da noite para o dia, sargentos reclamam das condições de trabalho e dos salários que percebem na função de controladores de vôo. Ora, tenham paciência, tirando os militares que estão bem perto do poder, todos os sargentos, os suboficiais e os oficiais superiores de todas as FFAA estão ganhando uma miséria há anos. Se a moda pega, o pessoal que é designado, por ordens do governo, para tapar buracos em estradas, construir pontes de emergência e para levar urnas de votação para populações isoladas também teria o direito de “chiar” por gratificações extras – o pessoal que foi para o meio da selva resgatar as vítimas do acidente com o avião da Gol também. De modo que, se os controladores militares o estão fazendo agora, é porque foram “incentivados” a fazê-lo e, mesmo assim, controladamente. Porque já está mais do que provado que paciência de militar não tem limite – há pelo menos 15 anos, são humilhados, vitimados pelos ataques constantes da imprensa, financeiramente vilipendiados e simplesmente não reagem. Foram convencidos de que as ofensas estão dirigidas a militares de antigamente e que ganham mal porque todos no país estão em dificuldades. Aliás, entre outras coisas, também se tornaram incapazes de reconhecer um comunista, nem dentro nem fora dos quartéis.
Eu só sei é que, em algum momento, em algum lugar, algumas pessoas decidiram que valeria a pena “correr o risco” de arriscar vidas humanas em prol do que, no final de tudo, acaba podendo ser resumido em dinheiro, assim como agora, que disparam na busca de quem terá menos prejuízos financeiros em pagamentos de indenizações aos familiares das vítimas, em detrimento da busca da verdade e da luta pela punição dos culpados. Resumem o ressarcimento dos familiares e as punições em dinheiro. A nós, cidadãos, cabe rezar para que o destino não nos coloque na materialização dos riscos calculados e que ele – o destino – também se encarregue de punir os verdadeiros culpados desta e de outras tantas tragédias.
(*) O transponder da Honeywell usado no Legacy é suspeito de fazer parte de uma série defeituosa que já teve um “recall” divulgado e ainda em processo de realização. A empresa negou o fato em relação ao transponder específico que estaria instalado no Legacy, mas depois se embaralhou toda com as informações divulgadas – de modo que não se sabe, até hoje, o modelo e nem o número de série do aparelho usado no Legacy. A empresa está sendo acionada nos EUA pelos advogados de uma das comissões de parentes de vítimas do acidente. A Embraer, que vendeu o jato para a norte-americana ExcelAire e poderia sanar as dúvidas dizendo o que há no seu avião, já se manifestou dizendo que não se pronunciará até o fim da investigação. O jornal Folha de São Paulo correu atrás das informações e conseguiu falar com o porta-voz da Honeywell Bill Reavis que, questionado, inicialmente afirmou que nenhum Legacy estava sob recall, como havia dito à imprensa americana. Entretanto, como diz a matéria da Folha, confrontado com o fato de a Diretriz de Aeronavegabilidade 2006-19-04, da FAA, citar o EMB-135BJ, que é o nome oficial do Legacy, disse que "aquele avião específico do acidente" não estaria sob suspeita. Mas, depois informou o número de série de componentes do transponder com o código com que a Honeywell designa as unidades de comunicação.
O defeito – ou o principal deles - inviabilizava tanto o controle de vôo em terra quanto o sistema automático de anti-colisão existente a bordo dos aviões. Na Europa foram tomadas providências assim que os problemas foram identificados depois de algumas ocorrências. Dados mais precisos, podem ser obtidos no site da SkyGuide, organização de controle de vôo no espaço aéreo europeu sediada na Suíssa, mais especificamente num boletim publicado sobre a disfunção do referido transponder (em inglês). Na página 6 desse boletim há referência claríssima aos aviões da Embraer. No mesmo site, há três boletins que falam sobre a proibição do uso de tais transponderes em aeronaves que circulam sobre a Europa.
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