Monday, May 28, 2007

A FORCA

Christina Fontenelle
28/05/2007
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A mídia deveria estar de luto. Os jornalistas deveriam estar todos de preto, de luto. O canal 2, onde a RCTV fazia suas transmissões, na Venezuela, escureceu nas telas de milhões de venezuelanos, dando lugar à nova TV de Chávez, que iniciou sua programação elogiando o governo de vosso ditador e apresentando um documentário sobre Simon Bolívar – falsificando a realidade e a História, mais uma vez, é claro. Protesto e guerra nas ruas – venezuelanos contra venezuelanos. Oitenta por cento da população foi contra o fechamento da emissora.

Onde estão os artistas admiradores de Chavez que se derretem em elogios à latinidade socialista do vizinho ditador, neste momento? Bem, o site Vermelho.org. noticiou o acontecimento:

“Exatamente à 0h01 desta segunda-feira (28) entrou no ar a nova emissora de TV venezuelana: a Televisora Venezuelana Social (TVes), captada por sinal aberto no canal 2, espaço ocupado ate às 23h59 de domingo pela RCTV, cuja concessão não foi renovada pelo governo. A TVes promete disponibilizar aos venezuelanos uma programação variada, com amplos espaços para o entretenimento e para a educação da população. A chegada do novo canal foi acompanhada pelas reclamações de alguns grupos contrários ao presidente Hugo Chávez e por festejos em diferentes partes do país... a programação será dirigida pela jornalista Lil Rodriguez, produtora e apresentadora do TeleSul, que enviou aos telespectadores uma saudação na qual garantiu que sempre haverá uma sintonia com os interesses do publico”. (28 DE MAIO DE 2007 - 10h53)

A neutralidade jornalística tem limites e tem um preço também. E eu não estou falando da notinha acima, não, que não tem nada de isenta. Mas, da mídia brasileira de um modo geral. Deram cobertura ampla ao fato, sim, como não? Mas, deveriam ter militado, como tantas vezes já o fizeram, por exemplo, a favor do desarmamento da população, a favor da primeira eleição de Lula para presidente, a favor das “Diretas Já” e de tantos outros temas. O preço da neutralidade profissional pode ser a forca. E a forca pode ser a própria aniquilação futura ou a inutilização de seus profissionais.

Para que serve um jornalista se sua função passar a ser a de simples colhedor de notícias não censuráveis. Acabe-se, então, com a profissão e municie-se, pois, dois cidadãos comuns, moradores de cada quarteirão das cidades, com câmeras e microfones, para que reportem simples fatos notáveis a cada redação local, a fim de que sejam escolhidos ou não como cabíveis nos noticiários. Paguem-se salários de gorjeta a cada um deles. De que serve um médico se não houver remédios e nem condições de trabalho? O que é um militar que serve a governos, e não ao seu povo e à sua Constituição, senão um militante oficialmente armado? O que é um jornalista que serve a governos senão um militante?

Devemos, sim, nos preocupar com o que, hoje, acontece com os outros, ainda que seja por puro egoísmo, temendo que o mesmo venha a acontecer conosco. Repito: o preço da neutralidade pode ser a forca.


Sunday, May 27, 2007

AOS MEUS VIZINHOS

Christina Fontenelle
Devo confessar que, especialmente nos últimos anos, devido ao sucesso retumbante dos planos do Foro de São Paulo no tocante ao fazer da América Latina uma grande república socialista, minha antipatia por nossos vizinhos começou a ultrapassar os limites das disputas esportivas – conhecidas batalhas ufanistas, carregadas de xenofobia. Realmente a colonização brasileira foi ímpar no continente e nos trouxe características bem diversas nos mais diferentes campos. É verdade que, em alguns lugares do país, há coisas em comum com alguns de nossos vizinhos de fronteira, mas nada que nos descaracterize completamente de nossas raízes genuinamente brasileiras – justamente no que elas têm de diversidade e de miscigenação.

Entretanto, e muito disso devo aos amigos que fiz na internet, como a escritora Graça Salgueiro, por exemplo, comecei a ter a oportunidade de compartilhar idéias, observar atitudes e finalmente conhecer o lado de nossos vizinhos que transcendem suas nacionalidades – sua inteligência, seus desejos, seus sorrisos, suas tristezas. Ou seja, comecei a enxergar pessoas. Expandindo este modo de olhar para as gentes, ao observar os povos do mundo todo, começou a ficar cristalino que os anseios, as lutas contra a opressão e as buscas de saídas para que haja o convívio pacífico entre os homens, sem que se percam as liberdades, são (ou estão se tornando) o ponto comum, em todas as sociedades, de maneira geral. Seja qual for o tipo de guerra que venha a ser chamada pela História de a “Terceira Guerra Mundial”, ela será entre os que lutam pela liberdade e os que defendem a escravidão, entendida esta como a renúncia do homem ao seu livre arbítrio – que, ao final das contas, é o que dele faz um indivíduo. Ora, ao renegar e/ou renunciar à sua individualidade – e ao seu livre arbítrio, por conseguinte – o homem, finalmente, renuncia à parte de Deus que lhe cabe.

É por isso que devemos sim nos unir a todos os homens que lutam pela liberdade, estejam eles na Rússia, na China, nos EUA, no Iraque, no Haiti, no Equador, na Venezuela – devemos globalizar a luta pela liberdade. Não devemos atacar a globalização no que ela tem de bom. E, uma de suas boas coisas, sem dúvida, foi promover o encontro intercontinental de gente que se descobre irmã na sua humanidade.

É com tristeza que coloco os dois links abaixo, nos quais se poderá ver a despedida dos profissionais na RCTV da Venezuela e o massacre dos venezuelanos pelas tropas de Hugo Chávez – ocorrido em 11 de abril de 2002. Desgostos de um povo que descobri ser bravo. Espelho de tristezas e tragédias de um socialismo igualitário que joga irmãos contra irmãos. Quem divide o inimigo vence a luta.

http://www.venezuelapress.com/2007/05/despedida-estelar/
http://video.google.com/videoplay?docid=-5793200611323299754&pr=goog-sl

Thursday, May 24, 2007

GRITOS DO SILÊNCIO


Christina Fontenelle
25/05/2007
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Contra a intolerância dos ricos, a intransigência dos pobres. Não se deixe cooptar. Não se deixe esmagar. Lutar sempre”.

A frase estava estampada nos 60 diplomas entregues aos formandos em cursos de especialização pela universidade Florestan Fernandes, do MST, em novembro de 2005. O então secretário-geral da Presidência, ministro Luiz Dulci, estava presente. Lula sabia.

Antes disso, e de lá para cá, não só o MST, mas todos os movimentos sociais (sociais é ótimo) vêm alternando tempos de silêncio e tempos de agitação – tudo perfeitamente coordenado, de norte a sul e de leste a oeste do país. Isso já não é mais novidade.

Depois do quebra-quebra no Congresso, a invasão da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, por cerca de 600 famílias de integrantes do MST, da Via Campesina e do, vejam só, Movimento dos Atingidos por Barragens, talvez seja a ação mais ousada dos movimentos sociais financiados com verbas governamentais. Na ocupação, houve lançamento dos conhecidos coquetéis molotov. Lula autorizou o envio de tropas da Polícia Federal e do Exército para garantir que não haja interrupção no fornecimento de energia à região Norte. Mandou negociar. Um dos líderes dos ocupantes disse que, se o Exército agir e tentar retirar os manifestantes da usina, estarão todos prontos para reagir a altura.

Na quarta-feira, integrantes do MST bloquearam 39 rodovias federais e estaduais (São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás, Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Paraíba). É a “jornada de lutas unificada” por mudanças na política econômica, contra as reformas liberais da legislação trabalhista e previdenciária e em defesa de uma reforma agrária anti-latifundiária. Além do bloqueio em rodovias, o MST participou de atos públicos no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Bahia, Brasília.

Em São Paulo, o prédio da reitoria da Universidade de São Paulo (USP) foi invadido e continua ocupado, desde 3 de maio, por estudantes e funcionários. O coordenador jurídico do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), Alceu Carreira, disse que o juiz Edson Ferreira da Silva, da 13ª Vara da Fazenda Pública, "está limitando o debate democrático da questão" ao negar o pedido do Sindicato para adiar a reintegração de posse da universidade. O juiz é anti-democrático, o sindicato, alguns alunos e funcionários da USP é que estão promovendo um “espetáculo de democracia” não é mesmo?

Adolescente é que costuma achar que diálogo com os pais é quando estes aceitam suas reivindicações. Quando dizem um sonoro NÃO, os pais são imediatamente rotulados de radicais intransigentes. Diálogo pressupõe troca – e, por vezes, é uma disputa entre argumentações na qual ora se perde ora se vence. É preciso que esse pessoal aprenda isso. Mas, eu estou apenas sendo gentil com a inteligência alheia. O problema, de verdade, é que não é bem de diálogo e nem de democracia que os movimentos sociais estão falando e muito menos procurando.

Em Maceió, um grupo de estudantes da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) ocupou, nesta quinta-feira (24/05), o gabinete da reitora, no campus daquela cidade. Os manifestantes quebraram portas e janelas, agrediram o fotógrafo da assessoria de imprensa da universidade e trocaram insultos com funcionários. Pessoas ligadas ao Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL) ajudaram a ocupar a reitoria. Existem faixas de apoio à ocupação da USP espalhadas pelo prédio. Os estudantes e seus colegas do MTL estão lutando por melhores condições de ensino e ampliação da biblioteca? Não. Do alto de sua imensa experiência acadêmica, eles são contra a reforma universitária. Querem, também, que a escola agrotécnica saia do foco das grandes monoculturas e se volte para os interesses da agricultura familiar. Os alunos são contra os cursos pagos e a cobrança de quaisquer taxas acadêmicas. Querem a ampliação do restaurante e da residência do campus e desejam a instalação de uma creche gratuita nas dependências da universidade. Só isso.

Ora, mas que ótimo! É tudo com o que sempre sonhamos: brasileiros contra brasileiros numa guerra sem fim, por todos os lados e por toda parte.

Desagradável e criticada unanimidade, somente entre os jornalistas. Pelo menos foi assim que Gilson Caroni Filho, que é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha-RJ) e colaborador do Jornal do Brasil, do Observatório da Imprensa e de La Insignia, analisou os articulistas da mídia, no artigo “O apagão da imprensa”, na coluna Análise & Opinião, de Carta Maior, em 05/05/2007. Segundo Gilson, “triste foi ver a grita moralista unir reacionários conhecidos a esquerdistas combativos nas páginas de política. O que o método separou, o discurso uniu”.

Para o analista, “reacionários” são todos aqueles que não defendem a ideologia socialista, e o fato de seus discursos terem coincidido com o de esquerdistas combativos não foi provocado pela incontrolável insurreição da realidade, mas pela necessidade de vender jornal: “Render-se aos clamores de segmentos médios, expressos nas páginas dos jornais, não revela inteireza ética, mas oportunismo político e atração inequívoca pela ética do consumidor. Assim morrem as mariposas. E se reproduzem editores”.

O professor pretendeu, segundo escreveu, “Iluminar o norte dos considerados “formadores de opinião"”. Ato falho, apesar de ser o único a assinar o artigo, prossegue, esclarecendo que “Não é nosso objetivo propor que se passe uma borracha em todos os erros cometidos”. Nosso? Dele e de quem? Mas, insiste em que a mídia deveria ter se rendido ao fato de que “Nesse período, o Partido dos Trabalhadores e suas bases sociais fizeram o país avançar politicamente como nenhuma outra força de esquerda havia logrado antes”. E termina: “Aos lúcidos sobrou uma saída. Abandonar palavras de ordem vazia e adotar uma postura crítica. Bem distante do socialismo de salão. Bem longe dos distintos colunistas e seu público alvo: os inconformados da classe média que, perplexos e espumantes, vêem o país mudar, incorporando novos atores”.

Os inconformados, perplexos e espumantes da classe média precisam parar, então, de comprar, de assinar ou de acessar os veículos em que o senhor Gilson escreve. Os inconformados, perplexos e espumantes da classe média deveriam, também, parar de pagar a faculdade particular onde o professor Gilson dá suas aulas. Os tais dos inconformados, perplexos e espumantes da classe média já estão de saco cheio de pagar para que os movimentos sociais que o tio Gilson defende saiam por aí destruindo tudo que encontram pela frente. É natural que se tenha inimigos. O que não é nada natural é que se os fortaleça incessantemente. Palavras vazias são as proferidas por pessoas que se desdizem em seus próprios atos – cuspir no prato que se come não é lúcido nem crítico – também não chega a ser honorável. Antes de apontar o cisco no olho dos outros, é muito conveniente que se retire a imensa farpa dos próprios olhos. Mas, é lógico que, para isso, é preciso perceber a presença de tal farpa – dois neurônios e um espelho são suficientes.

Os argumentos do professor têm muito em comum com os dos focos de guerrilha instalados pelos movimentos sociais em grande e progressiva escala, por todo o país. Os discursos que proferem são claros – não deixam dúvidas quanto ao que se deseja. Nesse caso, nem espelho é necessário, bastam apenas dois neurônios para vislumbrar o futuro que bate às portas do país, com malas e cuias. Seria muito bom que os pejorativamente chamados de reacionários incorporassem o verdadeiro significado dessa palavra, ou seja, “aqueles que reagem”. O “apagão da Imprensa” acontece porque palavras já não surtem efeitos e não comportam mais as amplitudes da reação necessária. Não há mais o que dizer nem para onde encaminhar análise nenhuma.

Contra a intolerância dos ricos, a intransigência dos pobres”. E contra ambos e a favor de todos, a rebeldia de um povo que, por tradição, dá à paz e à diplomacia todas as chances antes que se esgotem. Mas, que ninguém duvide: o povo desta terra veste verde e amarelo, ama a liberdade e canta o Hino Nacional - ainda que só a sua poderosa estrofe, mas com lágrimas nos olhos -, há muito mais gerações do que vem assistindo a uma minoria dar gritos de guerra para dividi-lo.

PROJETO INSISTENTE

Christina Fontenelle
24/05/2007
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A oitava versão do projeto de lei sobre crimes virtuais do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) que iria ser votada nesta quarta-feira (23/05), na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, entrará na próxima pauta, semana que vem. Se aprovado nessa Comissão, o projeto ainda precisa ser aprovado no plenário do Senado Federal e terá que passar por votações no plenário da Câmara dos Deputados.


A nova proposta sofreu mais de 40 outras modificações e já não contém mais a exigência do cadastro obrigatório de usuários da rede, que tanta (e justa) polêmica provocou no final do ano passado. Porém, passa a obrigar os provedores a encaminhar denúncias, de maneira sigilosa, às autoridades, sobre possíveis condutas ilegais de usuários sob sua responsabilidade – o que, para o assessor técnico de Azeredo e responsável pela redação do projeto, José Henrique Portugal, "trata-se de tornar oficiais práticas que já são adotadas pelos bons provedores".

Bons provedores? Condutas ilegais? Não está faltando um pouco de informações, de especificações e até mesmo de satisfação aos criminosos em potencial – no caso os internautas e os empresários do setor? Só o Código Penal e a legislação brasileira definem mais de 600 condutas como crime. Além disso, ainda não há definição do marco regulatório da Internet no Brasil – é colocar o carro na frente dos bois.

Em reportagem publicada na UOL, o coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV-RJ, Ronaldo Lemos, classificou o impacto do projeto nesta nova versão como "devastador", já que "o empresário do setor ficará desestimulado a tentar criar alguma coisa nova, por receio de violar a lei e de ter que arcar, não só com responsabilidades civis, mas também com sanções criminais e penais". Isso, ainda segundo Lemos, "causará estagnação no mercado de Internet e de tecnologia no país".

Depois da audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Câmera Federal, em novembro do ano passado, tanto o projeto como o senador receberam uma chuva de críticas vindas de todos os lados, através da mídia. Por isso, ele reduziu o grupo que o discutia, de cerca de 50 para 6 pessoas. Simples assim. Fez as modificações que achou conveniente, sem rediscutir o projeto com a sociedade. Tanto é assim que nem o presidente da Associação Brasileira de Provedores de Internet (Abranet), Eduardo Parajo, teve acesso ao substitutivo.

A Abranet, por sua vez, já enviou ao Comitê Gestor da Internet no Brasil (órgão misto, com representantes do governo, de empresas e da sociedade, responsável pela administração e organização da rede mundial de computadores no Brasil) uma proposta de código de conduta a ser adotado pelos operadores de redes e prestadores de serviços de Internet no país. O documento exige, entre outras coisas, que os provedores signatários não promovam práticas contrárias à legislação nem incitem violência, preconceitos ou pornografia infantil, e estabelece regras para a coleta de dados, como a necessidade de autorização prévia por parte dos usuários, e de políticas de privacidade.

O código de conduta da Abranet prevê, ainda, a manutenção de registros de acesso dos usuários, por três anos, nos provedores. Eles parecem ter cedido neste quesito, porque sabem que estes dados são muito importantes para que se chegue a criminosos que tenham praticados graves crimes pela internet. Porém, já avisaram que o custo é alto. Quem é que vai pagar a conta? Mas não é só isso. Por seu lado, o projeto do senador Azeredo estabelece que o provedor estará sujeito a pagar multas, entre R$ 2 mil e R$ 100 mil, caso não atenda às obrigações de manter ou fornecer os dados sobre seus usuários que forem solicitados pela Justiça.

Segundo Parajo, o código de ética que a entidade tem redigido nos últimos quatro meses e a legislação existente já seriam suficientes para trazer segurança ao usuário de Internet no Brasil. Entretanto, para Thiago Tavares, presidente da SaferNet Brasil, organização não-governamental responsável pela central nacional de denúncias de crimes cibernéticos, ainda seria cedo para saber se o código de ética seria capaz de, sozinho, combater o cibercrime. Segundo ele, e isso é óbvio, "vai depender de quantas empresas vão respeitar o código", principalmente no tocante à manutenção dos registros de acesso para que “os crimes não fiquem impunes e as investigações prejudicadas."

Um outro ponto do projeto do senador Azeredo que devesse gerar polêmica, mas que fica prejudicado pela linguagem legal e legislativa em que se dá, é a criação de um artigo no Código Penal que passasse a equiparar dados digitais a "coisas" -. artifício utilizado para dar efeito legal à suposição de que um determinado bem imaterial seja considerado como um bem material, como acontece na legislação dos direitos autorais. O que equivaleria a transformar, por exemplo, o ato de baixar dados da internet (filmes, músicas, etc.) em crime. Um retrocesso, justamente em tempo que as gravadoras estudam fórmulas para resolver este problema de outras formas.

Fazer dos provedores de internet arapongas do Estado não tem graça nenhuma, nem para eles, que não querem assumir esse papel e essa responsabilidade, nem para os usuários. Se um usuário enviasse e-mails aos seus contatos falando mal – ou divulgando informações que não possam ser provadas – de determinada pessoa ou do governo, poderia ele ser enquadrado criminalmente, por exemplo? Afinal, e-mails não seriam correspondência privada? Publicar alguma coisa em páginas da internet é uma coisa, mandar e-mails é outra. E aí? A pessoa poderia ser denunciada, investigada, presa ou qualquer coisa parecida por emitir opiniões particulares à sua lista de contatos?

Que ninguém tem mais privacidade nesse país, todo mundo está cansado de saber. Esse mal não atinge somente os brasileiros – é regra mundial. Se você realmente tiver um segredo ou uma informação muito importante e sigilosa, terá que agir, para repassá-la, como se estivesse na Idade da Pedra – homem a homem, olho no olho, e em lugar onde tiver absoluta certeza de que não poderá ser ouvido ou filmado. O problema com o projeto do senador Azeredo, portanto, não é esse. É justamente fornecer condições legais para que o material recolhido pela vigilância venha a servir como prova para incriminar pessoas. Isso é o que não pode tornar-se realidade.

Se a Polícia descobrir algum pedófilo na rede, mesmo que por vigilância indevida, ela que vá investigá-lo e arranjar um jeito de pegar o criminoso em ação, para prendê-lo. O que não pode é que uma pessoa vá para a cadeia pelo conteúdo dos e-mails que envia para sua lista de contatos. Muitas das melhores revelações investigativas dos jornalistas, por exemplo, saíram de suspeitas levantadas e denúncias feitas por e-mail. O que propõe o projeto do senador Azeredo não é somente vigilância sobre o crime, é invasão total e descarada de privacidade. Censura descabida ao último reduto de circulação de verdades neste país. Não é a toa que o texto do projeto propõe que crimes como calúnia, difamação e injúria passem a ter a ter pena elevada em dois terços caso cometidos por meios informáticos.

O problema, senador, é que no Brasil, calúnia, por exemplo, há muito tempo deixou de significar mentira, passando, isto sim, a se tratar de algo que não se possa provar concretamente – o que, aqui neste país, infelizmente, em um número cada vez maior de casos, passou a significar exclusivamente a confissão assinada de culpa do “caluniado”. Além do mais, caberia à vítima processar o suposto caluniador e não ao provedor, por assim dizer, “alcagüetar” o crime ou o criminoso às autoridades.

A nova proposta define ainda o mecanismo de "legítima defesa" na Internet, dando amparo legal para que profissionais ou empresas de segurança de informações façam a interceptação de dados ou até mesmo invadam outras redes, em nome da legítima defesa. O texto isenta de punição, por exemplo, profissionais de segurança da informação que realizem "phishing" (roubo de senha), “testem” códigos maliciosos e acessem redes, sem autorização, em caso de defesa digital ou de contra-ataques. Mas, os meros mortais como nós poderemos pegar de 1 a 5 anos de prisão se fizermos as mesmas coisas. Isso sem falar que os tais profissionais de segurança estariam autorizados a fazer justiça com as próprias mãos, já que, em tese, quando notarem que sua rede corre risco podem atacar seu algoz e alegar legítima defesa.

Ora, as leis em vigor no Brasil já compreendem crimes virtuais identificados na Convenção de Budapeste (acordo entre 43 países para combater o cibercrime), como acesso ilegal a sistemas, interferência sobre dados armazenados, falsificação de sistemas, quebra de integridade de dados, fraudes em sistemas informatizados - com ou sem ganho econômico -, pornografia infantil ou pedofilia, quebra de direitos autorais, tentativas ou ajuda a condutas criminosas, entre outros. Embora crimes como falsificação de cartões de crédito e de aparelhos de telefone celular e obtenção não-autorizada de dados não estejam nominalmente tipificados na legislação brasileira, há os correspondentes legais que têm sido aceitos para indiciar, processar e apenar criminosos. No máximo, poder-se-ia fazer algumas pequenas modificações legislativas.

Entretanto, a questão principal do projeto de Azeredo, ao que parece, continua a ser a vigilância e o cerceamento da liberdade de expressão dos internautas. Há limites para que os justos se conformem em ter que pagar pelos pecadores em nome da segurança, do bem comum, ou de seja já do que for. As pessoas direitas já não suportam mais a submissão a todo o tipo de vigilância, cerceamento e humilhações por causa de minorias criminosas. Parece até mesmo que “forças ocultas” desejem que se chegue ao ponto em que a única arma dos homens de bem, para viver em paz e em liberdade, seja a de fogo. Inimaginável e decepcionante que estejamos inaugurando o século XXI desta maneira.

Sunday, May 20, 2007

BONITA NAVALHA, FERNANDINHO!

Christina Fontenelle
20/05/2007

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As pessoas costumam enxergar o capitalismo e o comunismo como sistemas que regem as relações de trabalho e de troca comercial antagônicos. Na verdade, as relações capitalistas baseiam-se na preservação das garantias de propriedade privada dos bens de capital e de consumo e na suposta liberdade entre demanda e oferta (sejam elas de trabalho, de bens de consumo, etc.), auto-geradoras de um equilíbrio em permanente estado de alteração. No comunismo, não haveria a propriedade privada; mas, na prática, ainda que previsse a extinção do Estado, na medida em que as necessidades de todas as pessoas fossem sendo satisfeitas e as classes sociais se extinguindo, o último estágio da “revolução” jamais atingido foi o de um fortalecimento do Estado, representado, em última instância, por uma classe dirigente autoritária, concentradora e privilegiada que acaba por garantir a este Estado (e conseqüentemente a si mesma) o monopólio absoluto sobre a propriedade privada, sobre o lucro e sobre as liberdades individuais.

Outra coisa comum é associar o capitalismo à democracia e o comunismo à ditadura. Sem dúvida, democracias estão sempre associadas ao capitalismo. Mas, o comunismo tem “evoluído”. Desde o advento das urnas eletrônicas sem voto impresso e onde o registro de quem vota é feito na mesma máquina em que se vota, a democracia pôde ser reinventada e perfeitamente compatibilizada com a gradual comunização das sociedades. Há vários instrumentos de reinvenção, que vão, desde a transformação das urnas eletrônicas em verdadeiras caixas-pretas (onde sabe-se lá o que acontece com os votos) a usar o registro do voto associado ao do eleitor para punir quem vote na oposição (com desemprego, do próprio e de seus familiares, com perda de direitos sociais e todo o tipo de perseguição). É bem verdade que ainda haja muitos lugares onde essa maravilha eletrônica ainda não tenha chegado e onde ainda exista uma certa resistência aos sistemas “democráticos” de eleição. Acreditem, é uma questão de tempo.

Qual seria o maior sonho de um capitalista? Ser o único possuidor (e, naturalmente, único fornecedor) de um produto extremamente necessário (nem que essa necessidade fosse forjada por propaganda massiva) à vida de uma determinada sociedade. Dominar por completo o ciclo de produção deste bem, desde a extração de matérias primas até a venda do produto de consumo final – e, se possível, controlar, também, o sistema de financiamento deste aos consumidores. Livrar-se da concorrência e cercear a liberdade de escolha dos consumidores (seja por falta de opção ou por não ter a quem reclamar) é um sonho perfeitamente atribuível a qualquer grande capitalista. Pois não é justamente o que acaba acontecendo no comunismo – cujo capitalista faz parte da classe dominante do sistema ou é o próprio Estado? E se essa sociedade não for apenas um país e sim o mundo todo?

Durante o processo revolucionário socialista, a sociedade vai passando por etapas de extirpação dos inimigos do sistema. Conforme vai ascendendo e até que esteja definitivamente instalado no poder, é imprescindível ao partido socialista que a corrupção já esteja, e que seja ainda mais, completamente inserida nas relações entre o empresariado, os políticos, as autoridades e o Estado. Chantagens e vantajosas oferendas é o que será usado pelo partido para ascender e instalar-seno poder. Depois disso, não faltarão nem motivos e nem provas para enquadrar aqueles que forem tornando-se inúteis ou obstáculos a serem derrubados. Afinal, a polícia está aí para investigar crimes e prender criminosos mesmo – quanto mais aparentemente poderosos (leia-se ricos), melhor. Doa a quem doer, como gosta de dizer o presidente Lula.

Ora, criminosos devem mesmo ser punidos. Não restam dúvidas quanto a isso. Mas, nem todos o estão sendo. E o dinheiro na cueca? E o mensalão? E o dossiê Vedoin? E as ONGs que abrem, recebem doações e fecham? De onde vem tanto dinheiro? E os depredadores do Congresso? E as depredadoras da Aracruz Celeulose? Certamente não é por falta de competência que a polícia não tenha conseguido encontrar provas contra todos os envolvidos nestes sucessivos escândalos para indiciá-los e nem para descobrir a procedência de somas tão significantes. Quantos inquéritos estão sendo ou já foram conduzidos incorretamente? Quantos indiciamentos indevidos já foram feitos?

É bem verdade que, em muitas das vezes, a polícia prende e a Justiça solta. Solta culpados, mas também libera inocentes – é bom que se diga. E é bom que se lembre também que o país está repleto de empresários que são obrigados, ou a não pagar todos os tipos de altíssimos tributos que deles se cobra, ou a não cumprir tudo que a lei deles exige ou ainda a ter que pagar propinas para poder simplesmente trabalhar – não é sair nadando em piscina de lucros, não. Que fique bem claro também que são esses “malditos” capitalistas que empregam a maioria dos brasileiros. Ou esse povo acha que tem vaga pra todo mundo no aparelho estatal?

Com esta limpeza toda, que não é somente feita com prisões, mas também com as invasões no campo (levando muitos proprietários produtores a desistirem de seus negócios), com as sobrecargas de impostos, com a invasão do mercado interno por produtos importados de países onde a mão-de-obra é quase que escrava e com aumento desproporcional dos custos de produção, para citar apenas alguns motivos, acabaremos nas mãos de “meia dúzia de três ou quatro” conglomerados empresarias. Isso tem nome: é monopólio. E, pelo jeito, “essa meia dúzia de três ou quatro” só conseguirá essa hegemonia toda porque terá a permissão e a proteção do Estado para chegar lá. Isso tem um preço, que naturalmente será pago.

O sonho comunista não admite concorrência. Por isso, até mesmo o crime precisa ser monopolizado. Combatem-se os criminosos, não necessariamente para que se findem os crimes, mas para promover a ascensão de novos criminosos. Nesse jogo, não pode haver quem se iluda. Em prováveis futuras crises, quando já estiver com tudo dominado, e para assim permanecer, o partido não hesitará em fazer sacrifícios na própria carne. Esse dia chegará, e quem bem serviu ao partido não escapará. Mas, enquanto esse dia não chega, permaneçam todos aplaudindo a faxina que a polícia federal está fazendo país afora.

Chegará também o dia em que qualquer cidadão poderá ser preso quando o Estado assim o desejar, porque será impossível fugir da possibilidade de ser incriminado – seja por excesso de velocidade ao dirigir, seja por dar uma palmada num filho, seja por comprar um medicamento sem receita, seja por discorrer sobre os preceitos de sua própria religião, seja por não ter renovado o registro de arma de fogo que se tenha em casa, ou seja por uma infinidade de outras, hoje aparentemente inofensivas, criminalizações.

No último dia 17 de maio, por exemplo, foi aprovado na Câmara dos Deputados um projeto que propõe uma mudança na lei, de modo que esta passe a permitir que as provas derivadas de uma fonte ilícita (uma escuta telefônica sem autorização judicial, por exemplo) possam ter validade, caso uma outra fonte, independente (uma testemunha que tenha delatado a localização de drogas, por exemplo), justifique a sua apreensão. Isso mesmo: permissão para que se cometam crimes sob a justificativa de conseguir provar outros crimes. Essa permissão não é para qualquer um não, é para agentes do Estado (polícia, Ministério Público, juizes, fiscais, etc.) – qualquer um deles poderá produzir provas contra qualquer cidadão, sem precisar pedir autorização judicial, que só é dada quando ao juiz são apresentados motivos que justifiquem uma investigação. O relator do projeto é o deputado federal Flávio Dino (PC do B - MA), ex-presidente da associação dos juízes federais do Brasil.

É preciso que se observe muito bem as razões pelas quais alguns tipos de crimes são cometidos e por quem são cometidos. É preciso que haja um estudo sobre as opções ao crime. Os defensores dos direitos humanos, por exemplo, acham que os pequenos traficantes entram para o mundo do crime por falta de opção – são vítimas da “burguesia branca”. Pode ser que alguns empresários, profissionais liberais e até mesmo funcionários públicos também tenham que praticar crimes por falta de opção.

Minto. Sempre há uma opção ao crime. Fechar o negócio e virar camelô ou pipoqueiro, por exemplo. Hum... Isso não dá porque também não é legal. Emprego está difícil - não há vagas para todos. Pedir esmolas não é ilegal, mas não é exatamente um trabalho e, se o cara for bom e fundar uma espécie de indústria da esmola vai acabar sendo enquadrado como estelionatário ou qualquer coisa do gênero – de volta à ilegalidade. Dar aulas! Pronto, o cara pega tudo o que sabe (e sua formação acadêmica a tira colo) e vai ser professor numa escola ou numa universidade particular. O que? Precisa ter formação pedagógica e licença para lecionar? Quanto tempo leva para conseguir isso? Dois dias? Uma semana?... Ah... é muito tempo... o supermercado, a farmácia e as contas de casa não podem esperar tanto assim.

Evidentemente que eu estou tentando tirar gargalhadas de pedras. Justamente porque o assunto é sério e não tem graça nenhuma. Há criminosos que precisam ser punidos? Há. A polícia deve investigar os crimes e indiciar os suspeitos? Sim. A Justiça deve puní-los? Sem dúvida. Em contrapartida é preciso encarar o fato de que se uma lei proíba que se coma carne de porco, por exemplo, onde só haja porcos para comer, há de se convir que as maiores construções desse lugar serão os presídios. É bom que se lembre que, na Alemanha nazista, ser judeu era um crime. Quem não era judeu não se preocupou. Mas, depois, passou a ser crime falar mal do governo e os intelectuais passaram a ser perseguidos. Essa alusão já é antiga e bem conhecida. Todo mundo sabe como termina, não sabe?

Thursday, May 17, 2007

SER OU NÃO SER?

'Ecce

Christina Fontenelle
17/05/2007

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O gesto de “lavar as mãos” entrou para a História depois de ter sido literalmente praticado pelo Procurador da província romana da Judéia, Pôncio Pilatos, após a condenação de Jesus à morte por crucificação, pelo voto popular direto. O procurador questionou a decisão dos presentes, dando a entender que não concordava com o veredicto, pelo menos aparentemente; mas, não fez valer nem o que julgava justo e nem a sua autoridade. Portanto, “lavar as mãos” não significa não poder fazer nada diante de uma situação ou de uma atitude com a qual não se concorde; mas, sim, não ter vontade de fazer nada para impedi-las, seja por indiferença ou por conveniência – que pode significar medo justificado ou interesse escuso. Neste último caso, o sujeito acaba agindo como Pôncio Pilatos – finge-se de nobre respeitador da opinião alheia, quando lhe é conveniente, e se aproveita do erro dos outros para deixar que se faça algo que lhe sirva, sem ter que carregar o ônus da autoria.

Desde que o tema aborto deixou de ser proibitivo à mídia de grande alcance nas rápidas entrevistas concedidas pelo presidente da república - precisamente após as últimas eleições presidenciais -, Lula vem dizendo repetidamente que é, pessoalmente, contra o aborto, ao responder sobre o tema. Mas, sempre completa sua resposta, dizendo qualquer coisa parecida com o que disse na “entrevista coletivo-engessada”, concedida no último dia 15 de maio, no Palácio do Planalto: “Todo mundo sabe que existe uma quantidade exagerada de mulheres que faz aborto no país... Vão ficar como? Abandonadas? Eu defendo que o Estado dê o tratamento adequado”.

Isso é o que se chama de lógica pseudo-analítica invertida dos padrões da normalidade compreensível sinteticamente aplicada. Entendeu, caro leitor? Não? Ainda bem, porque a seqüência de palavras que eu coloquei não tem o menor significado e nem o menor compromisso com a lógica ou com a coerência. Assim também é a resposta do presidente sobre aborto. Acredito, inclusive, que não tenha sido, digamos, interpelado por nenhum jornalista a respeito de tão nítida incoerência, porque emprego, atualmente, é tratado como um bem raro e valiosíssimo.

Quando diz que defende que o Estado dê o tratamento adequado às mulheres que fazem abortos, o presidente não deixa dúvidas quanto à sua posição favorável a que às mulheres caiba decidir sobre o destino dos filhos que conceberem – pelo menos enquanto eles ainda estiverem em seus ventres – e a que ao Estado caiba fornecer os meios adequados se a opção for pelo aborto.

O presidente diz que, pessoalmente, é contra. O que ele não compreende é que a sua opinião particular sobre o assunto talvez só interesse a ele mesmo. Opiniões pessoais não são leis e nem representam custos aos cofres públicos. O que interessa é a sua posição em relação ao assunto como estadista – como presidente da república. Esse posicionamento, sim, é que acarretará uma série de mudanças estruturais nos atendimentos hospitalares, na distribuição de recursos para a Saúde e que trará uma outra série de conseqüências sociais (sejam elas boas ou ruins, segundo a opinião de uns e de outros).

No seu primeiro mandato, o presidente Lula editou 234 medidas provisórias. De 1º de janeiro a 27 de abril de 2007, o governo já editou mais 24. Abusar de MPs, portanto, é uma constante na gestão petista. Entretanto, no caso específico do aborto, o presidente Lula passa o “abacaxi” para o Congresso – dizendo que a questão deve ser discutida e decidida por aquela Casa. O presidente não está mentindo quando diz que não enviará projeto sobre aborto para o Congresso – não precisa, pois o mesmo já está lá (1).

O projeto de lei, que está tramitando na Câmara sob o nome de substitutivo do PL 1135/91, define o aborto como um direito da mulher ao mesmo tempo em que extingue todos os artigos do Código Penal brasileiro que definem o crime de aborto, acrescentando apenas duas exceções: quando o aborto é praticado contra a vontade da gestante e quando do aborto resultem lesão corporal ou morte da gestante. Ou seja, só haverá crime se a mãe sofrer graves seqüelas ou morrer - matar o bebê, tudo bem.

O artigo 3 deste PL estabelece, ainda, condições bastante amplas para que o aborto seja feito: até três meses de gestação, por simples deliberação da gestante; até cinco meses de gestação, se a gravidez resultou de crime contra a liberdade sexual (o estupro, por exemplo); e até nove meses, se houver "grave risco à saúde da gestante" ou em caso de má-formação fetal. Em outras palavras, para quem conhece bem o país em que vivemos, o anteprojeto libera totalmente o aborto no País.

Ora, tramitam hoje na Câmara mais de 12 mil projetos. Mas, a cada ano, apenas cerca de 140 viram lei. O que faz um projeto ser aprovado é o interesse dos parlamentares e dos partidos, a articulação do Governo e a mobilização da sociedade. Depois de ter passado pelas Comissões Técnicas do Congresso, o projeto, sendo aprovado pela Câmara, segue para o Senado. Para passar a valer como lei, deve ser sancionado pelo Presidente da República – que tem o poder de vetá-lo, total ou parcialmente.

O veto do Presidente, por sua vez, pode ser confirmado ou derrubado pelos parlamentares. Portanto, não resta a menor dúvida de que, se não fosse do interesse do governo, de muitos parlamentares e do presidente da república, o tema do aborto ou passaria bem longe do Congresso ou ficaria por lá, anos e anos, como acontece com temas bem mais importantes, como a reforma de nosso sistema eleitoral, de nosso sistema tributário e tantos outros.

Como estadista, o presidente se coloca favoravelmente ao aborto. E não é de hoje. Em 2004, ele assinou o

PLANO NACIONAL DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES - um importante documento, publicado com o apoio do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher - que estabelecia entre as suas prioridades, "REVISAR A LEGISLAÇÃO PUNITIVA QUE TRATA DA INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ”, e que também apresentava como proposta, “CONSTITUIR UMA COMISSÃO TRIPARTITE, COM REPRESENTANTES DO PODER EXECUTIVO, PODER LEGISLATIVO E SOCIEDADE CIVIL PARA DISCUTIR, ELABORAR E ENCAMINHAR PROPOSTA DE REVISÃO DA LEGISLAÇÃO PUNITIVA QUE TRATA DA INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ".

Em 2004, o jornal "O Estado de São Paulo" reportou declaração da Ministra Nilcéia Freire, da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), de que a proposta de legalização do aborto contida no tal Plano não era uma iniciativa isolada daquela secretaria, mas de todo o Governo Lula. Em março de 2005, Nilcéia reiterou essa posição do presidente, assegurando que o próprio Lula havia estava pessoalmente interessado na legalização do aborto no Brasil, tanto que, em abril daquele ano, assim se comprometeu, num documento que foi entregue à ONU - o Segundo Relatório do Brasil sobre o Tratado de Direitos Civis e Políticos ao Comitê de Direitos Humanos da ONU (2).

No XIII Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores, em abril de 2006, foram estabelecidas as “Diretrizes para a Elaboração do Programa de Governo” (

íntegra do documento, no site oficial do PT). O item de número 35 diz que “O segundo Governo deve consolidar e avançar na implementação de políticas afirmativas e de combate aos preconceitos, à discriminação, ao machismo, racismo e homofobia. As políticas de igualdade racial e de gênero e de promoção dos direitos e cidadania de gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais receberão mais recursos... O Governo Federal se empenhará na agenda legislativa que contemple as demandas desses segmentos da sociedade, como o Estatuto da Igualdade Racial, a descriminalização do aborto e a criminalização da homofobia”.

O presidente diz que o aborto – e as mortes das mulheres que a ele recorrem em clínicas clandestinas – é uma questão de saúde pública. Inclusive por isso é que o projeto de lei que será encaminhado ao Congresso para votação assegura a realização do procedimento de aborto no âmbito do sistema único de saúde (SUS) e prevê, no artigo 4, que: os planos privados de saúde serão obrigados a cobrir as despesas com aborto – eles poderão excluir até procedimentos obstétricos, mas não poderão excluir os necessários à interrupção voluntária da gravidez realizada nos termos da lei.

Cabe a seguinte pergunta: “O que faz do abortamento uma questão tão grave assim que justifique a obrigatoriedade de aceitação de sua prática até mesmo pelos planos de saúde privados?”. Ora, o aborto não é uma intervenção cirúrgica necessária pela presença de uma doença e sim resultante do exercício do direito de liberdade da mulher de decidir sobre o próprio corpo. Nesse caso, os planos de saúde deveriam também ser obrigados a cobrir as despesas com cirurgias plásticas – consideradas esteticamente necessárias ou não, já que a decisão estaria a cargo da paciente (a dona do corpo). Se não quiser ter filhos, que aborte; se quiser seios maiores, que coloque silicone; se quiser cintura mais fina, que lipoaspire; e assim por diante.

E quanto aos médicos? Fazer ou não fazer o aborto será opcional? Ou serão todos eles obrigados a sugar dos ventres os fetos indesejados pelos corpos cheios de direitos das pessoas que os abrigam? Será que os médicos terão o privilégio de ser pessoalmente contra o aborto, e de não fazê-lo, assim como nosso presidente?

O que o presidente entende por questão de saúde pública? Milhares de brasileiros morrem, Brasil a fora, por falta de atendimento médico adequado. Isso é questão de saúde pública? Milhares de médicos “uivam” aos quatro ventos reclamando das condições de trabalho e dos baixos salários. No Brasil, o número de morte materna por cada 100 mil bebês nascidos vivos é alarmante: 260. Isso é questão de saúde pública?

O país trava, há 25 anos, uma batalha para abolir o mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, que, erradicada na década de 1950, ressurgiu com toda força em 1982. Mesmo assim, a doença prospera, atinge milhares de pessoas e faz vítimas fatais. Só nos três primeiros meses de 2007, dados parciais indicam que 190 mil brasileiros já tiveram a febre. No ápice da atual infestação, o Brasil viu pacientes com os dolorosos sintomas da doença esperarem até 15 horas para ter atendimento médico. Tudo indica que o ano fechará com um número maior de casos do que o registrado em 2006 - 345.922 doentes e 71 óbitos por dengue hemorrágica. Isto é questão de saúde pública?

Oficialmente, 160 mulheres morreram em 2006, no Brasil, em decorrência de abortos mal feitos. Isto é questão de saúde pública? Dizem que esses números revelam uma injustiça, pois mulheres ricas pagam até 5 mil reais para fazer aborto com segurança. Quantos brasileiros morreram em 2006 por não terem dinheiro para pagar por atendimento médico adequado para tratar de milhares de doenças? Isto é questão de saúde pública?

Afinal, o que é questão de saúde pública para o governo Lula? Pode-se separar o estadista do homem? A resposta deve passar, com certeza, pelo conceito de conveniência...


(1) No dia 27 de setembro de 2005, após reunir-se com o Presidente Lula para, conforme o jornal O Estado de São Paulo, obter o seu aval, a Ministra Nilcéia Freire entregou a proposta do governo para a total descriminalização do aborto no Brasil, ao Deputado Benedito Dias, presidente da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados.

(2) “O atual governo brasileiro assumiu o compromisso de revisar a legislação repressiva do aborto para que se respeite plenamente o princípio da livre eleição no exercício da sexualidade de cada um... O Governo do Brasil confia que o Congresso Nacional leve em consideração um dos projetos de lei que foram encaminhados até ele para que seja corrigido o modo repressivo com que se trata atualmente o problema do aborto" (página 12).

Monday, May 14, 2007

MULHERES OFENDIDAS

Christina Fontenelle
14/05/2007
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O atrito entre a deputada do PT-RJ, Cida Diogo, e o deputado Clodovil Hernandes (PTC-SP) está tomando proporções que, mais uma vez, envergonham os pobres coitados dos brasileiros que são obrigados a eleger, periodicamente, supostos representantes para compor as casas da Câmara e do Senado.

Entre o que possa ser considerado prejudicial à imagem das mulheres perante à sociedade, o que tem feito a deputada dá de mil a zero no pronunciamento feito por Clodovil em relação a elas há poucos dias.

O deputado havia dito que "as mulheres ficaram muito ordinárias, ficaram vulgares, cheias de silicone e hoje em dia as mulheres trabalham deitadas e descansam em pé". A frase foi dita em entrevista concedida por Clodovil antes de entrevistar para seu programa da JBTV a ministra Dilma Roussef. Naturalmente, o deputado decidira entrevistar a ministra justamente por não considerar que a mesma fizesse parte desse grupo de mulheres – e que, por isso mesmo, mereceria ser entrevistada. Ou seja, na verdade, estaria fazendo brilhar, por destaque, precisamente mulheres que se destacam por sua postura antagônica à referida frase.

O deputado pronunciou uma frase que se encaixaria como verdade para muitas mulheres. Para outras não. Mas, o fato é que Clodovil emitiu eminentemente uma opinião pessoal. E está ficando cada dia mais difícil e perigoso emitir opiniões pessoais a respeito do que quer que seja. A onda do patrulhamento, de todos os tipos, está se espalhando de tal forma que já estamos vivendo a época dos sonhos das mais cruéis ditaduras: a censura histérica coletiva, onde ao cidadão são dados os instrumentos para que acabe por calar os que se manifestem contrários, ou apenas diferentemente, dos padrões ideologicamente aceitos pelo Estado. Não se iludam, o contrário não acontece – ou seja, os que pensam em dissonância com o Estado não têm voz e nem vez, pois, acabam podendo ser enquadrados nos mais variados tipo de criminalização da opinião. A mídia está cheia de casos semelhantes de censura a opiniões acontecidos recentemente.

Eu não me encaixo no grupo de mulheres ao qual se referiu o deputado Clodovil. Portanto, o pronunciamento “passou batido”. Ponto final. Do mesmo modo, acontece quando dou de cara com as inúmeras ofensas diárias dirigidas aos representantes da mídia. Em primeiro lugar, porque geralmente nenhuma delas se aplica ao jornalismo que faço e, em segundo lugar, porque são eminentemente simples emissões de opiniões. Aliás, algumas destas opiniões, proferidas, em sua maioria, com intuito de ofender, em razão de quem as emite, podem ser até tomadas como elogios. É preferível ter que agüentar ofensas e poder falar livremente sobre qualquer assunto do que, em nome do direito de não ser ofendido, ver o triunfo ascendente das mais cínicas formas de censura até que se cale o contraditório.

Ofensa por ofensa às mulheres, entretanto, na minha opinião, ficou mais qualificada na atitude histérica da deputada Cida Diogo quando, aos prantos, subiu à mesa diretora da Câmara, informando ao deputado Inocêncio Oliveira (PR-PE), que presidia a sessão, que Clodovil havia falado palavras de baixo calão a ela dentro do plenário. Ora, a nobre deputada não luta por direitos iguais entre homens e mulheres? Mulheres não podem ouvir palavrões?

Mas, o pior mesmo foi a histeria. É de costume ancestral dizer que mulheres, quando lhes findam os argumentos, desandam a chorar para “vencer” as disputas. Assim, mesmo que não tenham razão, no mínimo, tiram o brilho da vitória do opositor, desqualificando-o pelos “meios” utilizados para vencer. Há mais verdades na atitude da deputada do que nas vãs palavras de Clodovil.

Além do mais, a nobre deputada tem demonstrado pouca capacidade de interpretação ao longo deste episódio em particular: não entendeu o contexto do primeiro pronunciamento do deputado – o que deu origem à briga entre os dois parlamentares – e muito menos o teor do segundo, em que Clodovil teria dito o seguinte, segundo a própria Cida Diogo: "olha deputada, a senhora há de entender que aquela afirmação que eu fiz de que as mulheres são vulgares, ordinárias, foi apenas para as mulheres bonitas, e até uma p... tem quer ser bonita. E a senhora é feia e nem para p... serve".

A deputada insiste em dizer que foi xingada de feia e de p... por Clodovil. De feia foi, mas de p..., não. Ela planeja entrar com uma ação na Justiça contra Clodovil pelas agressões verbais que o parlamentar dirigiu a ela e às mulheres. Mal interpretou a realidade outra vez a deputada: Clodovil ofendeu Cida Diogo e não as mulheres. Por enquanto, a deputada, como pertencente ao gênero feminino da espécie humana, tem contribuído para disseminar na mídia algumas das piores características histórica e culturalmente atribuídas às mulheres – como, histeria, descontrole emocional, deficiente capacidade de interpretação objetiva de documentos e da realidade, ter na beleza e na vaidade o calcanhar de Aquiles, etc. Um desserviço à luta das mulheres que tanto têm lutado para derrubar o fardo de tantos estereótipos seculares atribuídos ao gênero.

O líder do PT na Câmara, deputado Luiz Sérgio (RJ), tomou a “dor da mulheres” e protocolou, no último dia 11 de maio, na presidência da Câmara uma representação contra o deputado Clodovil Hernandes por quebra de decoro parlamentar. Ele quer que a presidência da Casa determine à corregedoria a abertura de sindicância e a punição do deputado com medidas disciplinares. Acreditem, para Luiz Sérgio, Clodovil tem sido “extremamente preconceituoso, sexista e homofóbico” no exercício do mandato parlamentar. Sem comentários – há limites para tergiversação. Para o líder do PT, “O deputado Clodovil desrespeitou de forma veemente a Constituição Federal, o Código de Ética e o Regimento da Câmara, incorrendo, sem prejuízo da responsabilização pela prática de crime, em quebra de decoro”.

Eu vou omitir neste artigo o nome de algumas dezenas de colegas do deputado Luiz Sérgio que poderiam ser enquadrados nos crimes apontados por sua excelência, por práticas bem piores e muito mais lesivas ao Estado brasileiro. Não por delicadeza, não. É que, no momento, não tenho condições financeiras de ser processada.

Tuesday, May 08, 2007

VIVA A RESISTÊNCIA FRANCESA!

Christina Fontenelle
08/05/2007
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Azul... Branco... Vermelho... As cores da França. Nada como ver as cores de uma nação ressurgirem das cinzas e da resistência a um coletivismo escravizador, em nome das sociedades compostas por indivíduos – estes, sim, voluntariamente unidos, mas em torno de ideais e de valores comuns, para construir um futuro digno, onde a convivência entre os homens e os povos dar-se-á pelo exercício consciente do livre arbítrio. Não haverá paz que dure se não for construída com base no exercício da liberdade.

São os rebeldes do século XXI acenando as bandeiras da resistência – a nova resistência francesa. Lições antigas de luta, de patriotismo e de liberdade que a França, mais uma vez, mostra ao mundo.

Em algum ponto do acompanhamento histórico, perdeu-se a chance de registrar, na mídia, uma ruptura que aconteceu entre os senhores do mundo – as oligarquias transnacionais (e seu ideal comunizador) – depois do qual um dos grupos optou por não achar graça nenhuma num jogo de cartas marcadas, cheio de jogadores robotizados, com reações perfeitamente previsíveis (ou mesmo chegou à conclusão de que o custo para manter bilhares de indivíduos na neo-escravidão globalizada não compensaria os monótonos lucros – imensos, porém, não desfrutáveis).

Os ideais de um mundo melhor, porém livre, não morreram. Foram sim encobertos por uma nuvem de organizações mundiais que pretendem construir um mundo unificado que atropele as nacionalidades e as individualidades. Acontece que o homem é um indivíduo – e os indivíduos gostam de manter sua identidade e de, ao mesmo tempo, construir suas próprias formas de convivência pacífica com o diferente – com base no exercício de sua liberdade de escolha. Com a saída do premiê britânico, Tony Blair, do governo do Reino Unido, a Europa deve passar por uma reestruturação na administração de sua economia, diplomacia e de seu poder milita r. Esta pode ser uma boa pista.

Sabe por que a França conseguiu mostrar essa reação ao mundo? Porque deu um show de democracia. É, um show. Espetáculo não é dar resultado de eleição quase que instantaneamente após o término das votações. Espetáculo é fazer valer a lisura do processo democrático. Show mesmo foi, no primeiro turno das eleições, todos os candidatos disporem de tempo equivalente de exposição nos meios eletrônicos – TV, rádio e internet, para expor suas idéias. Nessa contagem do tempo considerou-se não apenas as campanhas publicitárias dos candidatos, mas também suas participações em programas de entrevistas. Show foi a recusa dos partidos em submeter as eleições francesas à caixa preta da urna eletrônica sem voto impresso.

Cerca de 44,5 milhões de franceses registraram seus votos para presidente em postos espalhados pelo país e pelo exterior. Segundo o Ministério do Interior francês, cerca de 2 milhões de novos eleitores registraram-se para votar nas eleições de 2007. Destes, 1 milhão e 800 mil estão na França e outros 160 mil em outros países. Apenas 1,5 milhão de eleitores franceses (menos de 4% do total) votaram utilizando urnas eletrônicas. Mesmo assim, 68 mil pessoas assinaram, na internet, uma petição contra o uso destas urnas, que alguns qualificam de "máquina de fazer armadilhas". Foram 547 postos de votação no exterior para que os 820 mil cidadãos inscritos pudessem exercer seu direito ao voto, segundo o Ministério de Relações Exteriores da França. O país com mais franceses inscritos foi a Suíça (76 mil), seguida pelos Estados Unidos (74 mil), pela Alemanha (56 mil), pelo Reino Unido (53 mil) e pela Espanha (51 mil). Autoridades eleitorais enviaram aos postos fora da França 12 milhões de cédulas de votação, várias centenas de urnas e mais de 1 milhão de envelopes. Para quem sabe ler, “pingo” do “i” é letra.

Nicolas Sarkozy foi à direita muito mais distante que Mitterrand à esquerda. Não se associou à Frente nacional. Não abraçou nem mesmo o extremismo de direita de Pen. Satisfez-se em lhe asfixiar. Um vento novo começa a levantar-se. A maioria silenciosa encontrou o seu arauto. Sarkozy não tem a ambição de ser um intelectual. Sua preocupação, entretanto, em fazer uma refundação ideológica pode fazer dele uma espécie imprevista de Gramsci de direita, que se propõe a prever quais são os valores e as idéias que fazem mover as coisas. Descoberta de aplicação científica já citada por mim no artigo “Partindo Para a Ação”, cuja ciência está em descobrir como usar a arma do inimigo em favor de si mesmo.

Não somente neste, mas em outros artigos, eu tenho me atrevido a dizer (solitariamente, é verdade) que, ao contrário do que se pretendeu (e ainda se pretende) com o exagero midiático da repetição de mentiras, para que se tornem verdades, e da intenção nítida de promover a lavagem cerebral dos estudantes, falsificando a lógica e as verdades históricas, acontece o oposto, a olhos vistos: formou-se uma geração, ainda que paralela e não organizada, de seres instintivamente sedentos de verdades óbvias e desconfiados da repetição unânime de falácias que ofendem a inteligência e os instintos humanos.

Falta pouco para que se reconheça como idealizadora da globalização idiotizante do império universal coletivizado as teorizações de Karl Marx sobre o capitalismo selvagem. Para o famoso teórico, o capitalismo caminharia inexoravelmente para a autodestruição determinada pela irreconciliável luta de classes - entre proprietários e não proprietários dos meios de produção. Hoje, a realidade comunista provou que o comunismo não é nada além do capitalismo abraçado, autoritária e exclusivamente, pelo Estado – que se torna o único patrão.

Sarkozy pregou o ranascimento da meritocracia: “Numa sociedade justa, as distinções entre os cidadãos não devem depender do seu nascimento, da cor de sua pele ou dos estudos remotos - é o trabalho desenvolvido que deve ser o critério do sucesso. Os que querem trabalhar mais devem poder ganhar mais. Devem poder conservar o fruto dos seus esforços e utilizá-lo para preparar o futuro da sua família”. O novo presidente da França disse que o país está “cheio de talentos que não chegam a desabrochar, porque não há respeito aos méritos de cada um e porque não há oportunidade para todos”. Sarkozy afirmou ainda que “os que querem sair da precariedade devem poder contar com o apoio da comunidade – este é o tipo de solidariedade que queremos para a França”. Sarko, como é chamado pelos franceses, pregou a união entre os países da Europa, mas com respeito aos diferentes povos que a compõem, de modo que não se tema, mundo a fora, pela formação de uma nova potência intimidadora. Afirmou que a França deverá defender os seus interesses num mundo mais complexo, com firmeza, mas sem posturas inúteis, e levando em consideração a emergência de novas potências - China, Índia, Rússia e Brasil (é, ele disse isso do Brasil).

É perigoso endeusar as pessoas. E não é conveniente que se faça isso com Sarkozy. Na verdade, pouco importa, agora, se o homem não cumprirá o que prometeu, se trairá as expectativas dos que o elegeram. O mais importante, neste momento histórico, é identificar o esforço dos franceses para manifestar sua aversão ao politicamente correto, à ditadura das minorias, às opções de busca de soluções pela divisão da sociedade em grupos irreconciliavelmente antagônicos, à coletivização do indivíduo – que fica sem identidade própria. Os franceses mostram ao mundo que desejam união mundial, sim, mas baseada em valores concretos não relativistas, em aprendizado de como conviver pacificamente com as diferenças – sem que haja obrigatoriamente a submissão de uns pelos outros.

Democracia se experimenta com voto explícito e liberdade se conquista com a eterna busca da verdade. Viva a resistência francesa! E que se espalhe, pelo Brasil, a ressurreição do verde e do amarelo! Não há um só passo que possa ser dado para solucionar os problemas que nos afligem que não deva ser necessariamente precedido pela reforma do nosso sistema de representatividade política e pela instituição do voto impresso na urna eletrônica.

Thursday, May 03, 2007

MAIO VERMELHO

Trabalhadores assistem a show organizado pela Força Sindical durante as comemorações do 1º de Maio, na zona norte de SP
Festa da FORÇA SINDICAL - SP


Christina Fontenelle
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Dia 1 de maio é o Dia Internacional do Trabalho. Isso, em si, não é notícia. As comemorações, algumas talvez. Mas, notícia mesmo é o que quem realmente trabalha “nestepaís” recebeu como homenagem: o fuzilamento “drive thru” de dois soldados da Polícia Militar do Rio de Janeiro. É bom que se ressalte: eles não estavam comemorando o Dia do Trabalho – estavam trabalhando.

Foi manchete nos jornais: a Força Sindical reclamou que recebeu menos verbas para as comemorações do que a CUT (Central Única dos Trabalhadores), entidade historicamente ligada ao governo petista e ao presidente Lula. Enquanto a primeira recebeu R$ 250 mil da Petrobrás, a outra recebeu R$ 600 mil para a festa - segundo o presidente da Força Sindical e deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP). A CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores) recebeu R$ 150 mil da empresa, além dos patrocínios de R$ 150 mil de Furnas e de R$ 80 mil da Bovespa. A Caixa Econômica Federal investiu R$ 580 mil nos eventos das três entidades - R$ 300 mil da CUT (para três comemorações em ações de cidadania e na festa de hoje), R$ 200 mil para a Força e R$ 80 mil para a CGT.

Pela região da praça Campo de Bagatelle, zona norte de São Paulo, local da festa da Força Sindical, passaram 1,3 milhão de pessoas, segundo estimativa da PM (Polícia Militar de São Paulo – que estava trabalhando). A Força gastou cerca de R$ 3 milhões na comemoração, que teve sorteio de dez carros (R$ 23 mil cada) e de cinco apartamentos (R$ 50 mil cada). Como o tema da festa foi "Os Trabalhadores em Defesa do Planeta", a entidade distribuiu 20 mil mudas de plantas nativas. A programação teve ainda mais de 40 shows. Pela festa da CUT, que ocorreu no cruzamento das avenidas Ipiranga e São João, região central de SP, também segundo estimativa da PM (repito: que estava lá trabalhando) estiveram reunidas cerca de 300 mil pessoas. Não houve sorteios, mas teve show).
O Colunista Cláudio Humberto disse em seu blog: ”pensando bem, só deveria comemorar o dia do trabalho quem estivesse empregado”. Seria lógico. Parece que, pelo Brasil, entretanto, só comemora mesmo quem faz parte dos grandes sindicatos e dos movimentos ditos “sociais” (MST, MLST, etc). O resto, ainda que trabalhe (e muito) que fique em casa, dormindo, ou dando plantão – trabalhando! No caso dos PMs, cabe a eles garantir a segurança das comemorações sindicais por todo o país, ou, em alguns lugares, servir de alvo para que os pobres coitados marginalizados, que, por “total falta de opção”, fazem do mundo do crime sua profissão, comemorem o dia do trabalho à sua maneira: fuzilando policiais.

Os brasileiros não tiveram muito mesmo o que comemorar. Pôde-se notar isso nas festas de comemoração por todo o país. Não são o verde, o amarelo, o branco e o azul as cores do Brasil? Pois é, mas a cor das comemorações foi o vermelho. Vermelho nas camisetas, nas bandeiras. Vermelho sangue. Sangue dos dois policiais metralhados no Rio, sangue de João Hélio e de tantos outros brasileiros estudantes e trabalhadores que morrem todos os dias pelo Brasil – em números que superam aos de muitas guerras civis. Resta-nos fincar cruzes...