Pois bem, não bastasse os vexames na cobertura da Copa do Mundo, quando Fátima Bernardes e um programa comandado por Galvão Bueno, que acontecia nos dias das partidas do Brasil, simplesmente desapareceram do ar, sem a menor satisfação, depois da derrota da Seleção Brasileira para a França, e o festival de manipulações e omissões de informações que a emissora vem patrocinando ao longo dos últimos 4 anos, agora, os telespectadores serão brindados pela mais espetacular cobertura “jornalística” de todas as eleições.
Espetacular no sentido de “show” – um show de divulgação de pesquisas eleitorais de caráter duvidoso (como no referendo do desarmamento), um festival de meias-verdades e de omissões (muitas delas imperdoavelmente criminosas), um espetáculo de romantismo bucólico dos mais distantes sítios brasileiros, onde os moradores dizem o que esperam do próximo presidente: uma ponte, uma lei que passe a administração de prédios históricos para os municípios, um poço, e por aí vai - inutilidades evasivas diariamente transmitidas pelo ônibus da caravana JN. Algo me diz que Lula ainda vai dizer que essa caravana do JN parece com a que ele fez antes de ser eleito presidente. Agora, sensacional mesmo está sendo a etapa de entrevistas com os principais candidatos à presidente.
Entrevista talvez seja um termo que não consiga definir exatamente o tom desta parte do Jornal Nacional que tem ocupado o último bloco das edições desta semana, com cerca de 12 minutos cada um. Inquisição seria mais adequado. Era de se esperar que houvesse perguntas enfocando algum tema polêmico relacionado aos candidatos ou aos seus partidos, assim como também que elas enfocassem pontos prioritários sobre os programas de governo dos candidatos. Não aconteceu isso com nenhum dos três entrevistados por Fátima Bernardes e por William Bonner na bancada do JN. Foram eles Geraldo Alckmin (PSDB), Heloísa Helena (PSOL) e Cristovam Buarque (PDT), nesta ordem, respectivamente na segunda, na terça e na quarta-feira.
Todos foram literalmente bombardeados com perguntas que indisfarçavelmente visavam desacreditar os candidatos, desmoralizando suas capacidades para governar. A diferença, entretanto, esteve na reação de cada um deles. Alckmin saiu-se extraordinariamente bem; eu diria que Cristovam Buarque, um pouco menos atacado que os outros dois candidatos, também; Heloísa Helena é que ficou desestabilizada, quando se viu sob o ataque das perguntas e das afirmações do casal de entrevistadores – perdeu para eles; os outros dois candidatos não.
Na sabatina de Alckmin, não foi dada a ele uma única chance de falar sobre seu programa de governo, sobre as medidas que tomaria para enfrentar os problemas de desemprego, de gestão de dívida pública, de saúde e de tantos outros que afligem os brasileiros. Em vez disso, o candidato passou o tempo todo rebatendo acusações. Primeiro, contra a política de segurança pública de São Paulo; depois, sobre se sua defesa de um banho de ética na política não seria incompatível com o fato de um Senador do PSDB ter sido beneficiado pelo valerioduto, lá na eleição de 1998; em seguida teve que responder sobre CPIs que não saíram durante seu governo e sobre irregularidades na publicidade da Nossa Caixa. Alckmin rebateu calma e eficientemente todas as acusações – uma por uma.
Os apresentadores cobraram explicações sobre a crítica que o candidato e o PSDB fizeram ao veto do presidente Lula para o aumento dos aposentados, fazendo questão de dizer que o Presidente teria sido obrigado a vetar o reajuste por falta de recursos. Alckmin disse simplesmente que teve dinheiro para tudo e para todos e que, quando chegou a vez dos aposentados, eles levaram um não. Fátima Bernardes apareceu com uma pesquisa que dizia que São Paulo não teria se saído bem na tal de Prova Brasil – mas essa não deu nem para engatar, porque Alckmin foi enfático em falar de números do Saeb que desmentiam os dados apresentados pela entrevistadora.
Para encerrar, perguntaram: “No fim de quatro anos, o que o senhor espera ter como marca no seu governo?” Ah, bom! Pensávamos nós, os telespectadores, que essa pergunta não seria feita. Então, o candidato pôde falar, em 5 segundos, sobre seus planos: “nosso compromisso é com o crescimento. O Brasil perde oportunidades... não tem o projeto nacional de desenvolvimento. Eu vou ter como obsessão o crescimento... Emprego, renda, trabalho e os três serviços públicos de qualidade. Saúde... Educação e assumir responsabilidade em segurança pública. Não fugir...”. Acabou. Boa noite.
Foi uma chuva de protestos pipocando pela Internet e enchendo as caixas de correio eletrônico do JN. E a resposta é sempre a mesma: silêncio.
Dia 8 de agosto. Foi a vez de Heloísa Helena passar pela sabatina do jornal mais assistido no Brasil. Dessa vez, como não poderiam atacar nenhuma administração sob a responsabilidade da senadora, uma vez que ela foi apenas vice-prefeita, em Maceió, há 14 anos, o Casal 20 do jornalismo partiu para trazer à tona o perfil trotskista da candidata. Ela tentou remediar aqui e ali, tentou disfarçar, mas não deu. Ficou bem claro que Heloísa Helena é mesmo uma comunista inveterada – do tipo que apóia movimentos populares revolucionários, que desapropria para trazer “igualdade” na marra e coisas do gênero. A candidata não conseguiu dar uma resposta sequer sobre seus planos de governo que fosse além de longos, adjetivados e evasivos discursos.
Reparem nas respostas da Senadora às perguntas de Fátima Bernardes e de William Bonner. Ela simplesmente falou, falou e não disse absolutamente nada sobre seu programa de governo, mas não teve como esconder suas pretenções socialistas:
Fátima Bernardes: O programa de seu partido falando de reforma agrária diz que não existe saída para o campo brasileiro sem a expropriação das grandes fazendas, sejam elas produtivas ou não. A senhora vai tomar terras de proprietários rurais que produzem...?
Heloisa Helena: Eu não posso meu amor, porque a Constituição proíbe. Programa de partido se trata de objetivos estratégicos do partido. Não tem nada a ver com programa de governo. Seria impossível fazer a expropriação de terra, a não ser que tenha trabalho escravo ou plantação de maconha. Porque eu não sou favorável ao narcotráfico, pelo contrário, vai ter um combate implacável ao crime organizado se eu tiver a honra de chegar à presidência da República. Diferente. A Constituição do Brasil é muito clara. Porque eu tenho obrigação de conhecer a ordem jurídica vigente, a legislação do meu país. A Constituição do país é clara: terra improdutiva passível de reforma agrária. A nossa proposta de reforma agrária, ela se trata no sentido de assentar 1 milhão de famílias que daria 200 mil famílias, ou seja, 1 milhão de pessoas.
William Bonner: Qual o modelo de país que a senhora apresentaria como um exemplo para os brasileiros e dissesse assim: “este é o modelo que o P-SOL defende para o Brasil... Na vida prática não há um modelo em vigor?”
Heloisa Helena: Meu amor, deixa eu dizer uma coisa. Não há no planeta Terra nenhuma experiência socialista. Então seria desonestidade intelectual da minha parte e desconhecimento de toda a tradição socialista dizer que eu vou implementar o socialismo. O que eu digo várias vezes, eu não nego minhas convicções, acho inclusive que com essa estrutura anátomo-fisiológica eu não vou vivenciar a mais bela declaração de amor à humanidade. Hoje eu luto pela democracia. A democratização da riqueza, das políticas sociais, da informação e da cultura. Da terra e do espaço bom, porque a democracia no Brasil não existe... A democracia não se consolida porque nós estamos falando o que pensamos. A democracia de um país não se consolida quando 48% de toda a riqueza produzida nacionalmente ela é apropriada por 0,005% das famílias brasileiras.
Reparem que “democracia” para Heloísa helena não tem nada a ver com liberdade de expressão ou com direito de votar dos cidadãos. Para ela, o termo significa fabricar igualdade social por intermédio da ação impositiva e controladora do Estado – que, naturalmente, estaria nas mãos de pessoas que se julgam capazes de determinar o que é o melhor e mais justo para todos (e esse deve ser o caso da Senadora).No dia 9/08, a bola da vez foi o Senador Cristovam Buarque. Para começar, foi com a seguinte pergunta que William Bonner deu as boas vindas ao candidato: “Como governador o senhor não conseguiu se reeleger, não passou na prova das urnas no fim do mandato. Como ministro, o senhor foi demitido pelo presidente Lula. Como é que o senhor se credencia à Presidência?” Resumindo a resposta do Senador:
“Nos dois cargos eu cumpri tudo o que prometi... E perdi (a reeleição para Governador)... (porque)... Me neguei a dizer que daria um aumento de 28% aos funcionários. O meu opositor disse que daria e não deu. Isso levou 15 mil pessoas, pelo menos, a mudar de lado... Quanto ao Senado e quanto ao Ministério, quando eu cheguei lá eu peguei o programa de governo do Lula e disse: ‘Isso é para valer’. E comecei a executar... Tudo o que precisava eu queria, eu comecei... Mas é o presidente que manda para o Congresso. O ministro não pode mandar projeto para o Congresso. E o que é que o presidente mandou dizer para mim? Que isso ia atrapalhar a reeleição dele, porque ia chegar ao prefeito, que não ia gostar. Então eles pararam. Eu incomodei tanto que eu saí e sinceramente não me arrependo”.
Vieram mais perguntas desconcertantes, porém, Cristovam Buarque, além de responder a todas elas com segurança e clareza, aproveitou para fazer propaganda de seus projetos para a área da Educação no país. Conseguiu fazer uma boa exposição do tema e acabou transfigurando a expressão facial dos entrevistadores, que passaram da aparência de inquisidores para a de atentos alunos. Mas falhou porque passou a impressão de ser homem de um “foco” só – pessoas assim dão ótimos ministros, mas não se enquadram no perfil que se exigiria do presidente de um país do tamanho e da complexidade do Brasil.
O próximo a ser entrevistado pela dupla do JN é o presidente Lula – candidato à reeleição. Partindo-se dos princípios de “isonomia”, não dá para começar com uma pergunta diferente de “Como pode alegar o senhor que não sabia do que seus auxiliares e companheiros de partido faziam no Governo e que acabou resultando na denúncia do Procurador Geral da República, qualificando-os de “quadrilha”?” Essa seria só para começar. A segunda pergunta deveria ser sobre as doações da Telemar para a empresa de seu filho Lulinha. Depois, sobre sua aposentadoria aos 22 anos de serviço e como anistiado político, já que nunca foi impedido de “trabalhar” no governo militar. Estaria aí um bom gancho para falar das indenizações absurdas que vêm sendo pagas a criminosos e a seus familiares, especialmente sobre uma das últimas – a que foi concedida ao chefe do bando que depredou o Congresso: seu amigo pessoal, Bruno Maranhão.
Todas estas perguntas estariam dentro das foram “permitidas” aos apresentadores do JN fazerem, uma vez que não tratam do “mensalão”. Sim, o PT só permitiu a entrevista caso só se pudesse fazer uma única pergunta sobre esse tema. Se a censura se ampliar para outras questões negativas, só vai dar para perguntar nome, local e data de nascimento ao atual presidente. Mas, não vamos nos precipitar, vamos esperar a entrevista acontecer.
Por enquanto, parece que as entrevistas estão servindo para destruir os adversários de Lula – de Bonner para Homer.
De Bonner para Homer II – O salário não é a única coisa que cai!
William Bonner: Candidato, o Ministério Público denunciou o que ele chamou de uma quadrilha de 40 integrantes, que teria como núcleo central, nas palavras do procurador, o seu ex-ministro chefe da Casa Civil, José Dirceu e dirigentes do PT, José Genuíno, Silvio Pereira, Delúbio Soares. Segundo a denúncia, eu vou ler um trechinho, os objetivos deles, desse núcleo eram: desviar recursos de órgãos públicos e de estatais para pagar dívidas do PT antigas e novas despesas. Tanto da campanha do PT quanto de partidos aliados. E ainda, segundo o procurador. O objetivo deles era garantir que o PT continuasse no poder comprando o apoio de outros partidos, numa referência ao mensalão. Candidato, diante de uma acusação tão dura quanto essa, que parte de um órgão politicamente independente. Como fica a questão ética, uma bandeira, um carro-chefe das suas campanhas eleitorais?
Os entrevistadores não poderiam deixar de falar no mensalão e na denúncia do Procurador Geral da República. Isso era o que todo mundo estava esperando para ver se iria acontecer. Aconteceu; mas não da maneira como deveria. É só refletir. Como o expectador estava esperando ouvir os apresentadores falarem de “mensalão”, de “denúncia do Procurador” e de “40 integrantes” não parou para prestar atenção na pergunta final – a que o candidato teria que responder, na verdade.
O expectador se alivia ao ouvir o que esperava; mas o fato é que nada do que William Bonner falou antes de fazer a pergunta final é novidade - todo mundo já cansou de ouvir, de denunciar e de falar. A pergunta final foi: Como fica a questão ética, uma bandeira, um carro-chefe das suas campanhas eleitorais? Foi o gancho para o presidente falar o que sempre tem dito: que foi ele quem nomeou o procurador, e que, apesar disso, pôde investigar e fazer a denúncia, o que provaria a isenção do Governo.
Mas, o que o Presidente obviamente sempre esquece de dizer é que o Procurador fez tudo isso (num processo que vai durar anos para ser julgado), denunciou toda a gravidade dos atos praticados, porém não citou o presidente Lula como envolvido. Isso sim, pela obviedade, se tivesse sido escrito pelo Procurador, poderia ter feito alguma diferença no destino de Lula e no desfecho do caso do emnsalão. Portanto, a denúncia foi inócua, pois os citados já haviam sido afastados pelo partido ou pelo Congresso e ainda, sem citar Lula, a denúncia acabaria servindo como “prova” de isenção, de idoneidade do presidente, por ter permitido que o Procurador trabalhasse livremente. Tanto é assim que este é o argumento que ele está usando agora.
Como assim, “como fica a ética”? Que ética? Pelo tamanho do escândalo, pelo tamanho das atrocidades cometidas pelo PT e pelos congressistas que comprou, não cabe perguntar sobre ética. Cabe perguntar sobre crime, sobre legalidade e sobre improbidade. Que ética, se o presidente da República disse em cadeia nacional, no programa dominical da Globo – Fantástico – que o PT fez caixa dois e que todo mundo fazia caixa dois?
A pergunta deveria ter sido: Como é que o senhor pode alegar que não sabia de nada? Inclusive agora, depois do lançamento do livro de Ricardo Kotosho, onde está escrito que o senhor esteve na cena onde foi acertado um pagamento para obter o apoio do PFL? E como é que o senhor não sabia, se foi o senhor mesmo que disse no Fantástico que o não só o PT mas todo mundo fez caixa dois? Se o senhor sabia sobre o caixa dois, e achava normal, porque todo mundo fazia, como é que alega que não sabia de como as pessoas que o cercavam faziam para administrar os recursos desse caixa dois – tanto para obtê-los, como para gasta-los?
Lula: O órgão independente onde o procurador-geral foi escolhido por mim sem que eu sequer o conhecesse. Uma demonstração de que o combate à ética significa você permitir que as instituições façam as investigações que possam e precisam fazer. E você sabe perfeitamente bem que o nosso governo, a Polícia Federal, a Controladoria-Geral da União têm trabalhado de forma excepcional para desvendar toda e qualquer denúncia. Obviamente que eu lamento profundamente que companheiros tenham feito coisas que ainda vão ser julgadas, porque há outra uma instância no Supremo Federal, mas nós facilitamos que tudo fosse investigado, afastamos todas as pessoas que estavam na ossada do presidente da República, é o que eu posso fazer, facilitamos o trabalho de todas as CPIs, eu duvido que alguém encontre um deputado que eu procurei para conversar sobre a CPI. A CPI fez seu relatório, mandou para o Ministério Público, o Ministério Público analisou e pediu o indiciamento das pessoas. Agora eu vou ser julgado.
William Bonner: Ainda não chegaram à conclusão.
Lula: Isso, não chegaram à conclusão e isso não macula o PT, pode macular algumas pessoas do partido.
William Bonner: Na denúncia oferecida pelo procurador-geral, ele faz referência ao ministro no governo Lula, além de integrantes do PT. Mais do que isso, nós sabemos também que um procurador-geral da República só oferece denúncia quando ele está plenamente convencido da culpa de quem ele acusa. Aí então, a pergunta que cabe numa situação como essa é a seguinte: o senhor tem dúvida sobre a idoneidade ou sobre a competência do procurador-geral da República, que como o senhor mesmo disse, foi o senhor que nomeou?
Já é a segunda pergunta que permite que Lula fale sobre sua não interferência em investigações. O que todos nós sabemos que não é verdade. Se assim não fosse, as CPIs não teriam tido a dificuldade que tiveram para obter documentos, para inquirir pessoas (lembram-se dos habeas corpus preventivos, das licenças para mentir?), não teriam sumido documentos do Banco Rural, notas fiscais da DNA e o Ministro Palocci não estaria sendo acusado de mandar invadir a conta corrente (entre outras coisas) do caseiro que o desmentiu no caso da “casa da maracutaia” em Brasília. Aliás, o ministro só saiu por causa desse episódio que, se não tivesse ocorrido, talvez significasse a sua permanência, já que, como no caso de Okamoto, se não houver confissão assinada ou fato extremamente contundente, o PT dá um jeito de dizer que nada seja prova irrefutável, o que permite que a pessoa acusada seja mantida no cargo que está.
Lula: Se tivesse eu não tinha indicado. Segundo, o procurador da República no meu governo indicia, porque em outros governos engavetava, no meu governo o procurador sabe perfeitamente bem, e foi um discurso William, que eu fiz na posse dele, de que jamais durante o meu mandato e mandato dele, haveria qualquer interferência do Poder Executivo para interceder no Ministério Público. É com esse grau de liberdade que eu quero que ele funcione e é com o grau de liberdade respeitando o estado de direito que eu quero que as pessoas que foram indiciadas por ele vá até o Supremo Tribunal Federal e prove se são ou não inocentes.
Fátima Bernardes: Candidato, durante todo esse tempo o senhor disse que não tinha conhecimento dessas irregularidades. Duas questões então: se o senhor insiste nessa declaração, que garantia o senhor pode oferecer ao eleitor de que o senhor não pode ser surpreendido novamente no caso de um futuro mandato por irregularidades cometidas por colaboradores seus?
Outra pergunta que permite que o presidente fale exatamente o que deseja que fique gravado na cabeça da população (Homer Simpson): que não dá para saber de tudo, não dá para vigiar todo mundo e coisas do gênero. Lula usa de uma comparação ridícula, mas que pode funcionar com o povão que tem preguiça de pensar: cita os pais que só vão saber que seus filhos cometem delitos quando estes são presos ou quando sai nos jornais.
Seria o caso da apresentadora dizer que a resposta não responde adequadamente à pergunta feita, por dois motivos: 1) porque não se pode comparar o grau de responsabilidade e o número de vidas envolvidas no trabalho de um presidente da república com o de um pai ou uma mãe de família. Compare com uma empresa, presidente. Se fosse uma empresa, como é que se qualificaria um presidente de empresa que não sabe de nada? e 2)porque isso não é verdade. Um pai e uma mãe podem não querer ver, ou então não ficarem em casa para ver – o que lhes desqualificaria como bons pais. Mas dizer que foram bons pais e nada viram ou perceberam é impossível. Porém, ao invés disso, a apresentadora perguntou se o que se esperava de um presidente seria o comportamento de uma mãe zelosa. Bem, nem de todo foi ruim. Melhor perguntar isso do que nada. E lá se foram 3 perguntas em torno do mesmo tema.
Lula: Ah, posso. Deixa eu lhe dizer uma coisa com muita tranqüilidade Fátima. Primeiro, eu tenho a responsabilidade por qualquer erro que qualquer funcionário público cometer no Brasil. São mais de 1,2 milhão. Eu sou o presidente da República, se eles cometerem um erro, direta ou indiretamente eu tenho responsabilidade de agir. Quando eu fico sabendo, eu puno afastando, faço sindicâncias e as pessoas então são investigadas de acordo com a lei. E um ministro não está fora disso e um outro funcionário. Nós temos prendido gente da Polícia Federal.
Fátima Bernardes: O senhor acha então que o senhor também errou presidente no caso dessas denúncias, o senhor também teria errado, o que o senhor poderia fazer de diferente no caso de um novo mandato?
Lula: Eu só poderia fazer diferente se eu soubesse antes. Eu soube depois que aconteceu. O dado concreto, Fátima, é que muitas vezes, ou por uma fé, ou quem sabe até porque estamos vivendo uma guerra política, as pessoas ousam dizer o seguinte: ‘olha, mas o presidente deveria saber de tudo’. Ora, vamos ser franco, vamos ser honestos entre nós. Está cheio de famílias que têm problema dentro de casa e a família não sabe. Está cheio de pai e mãe que ficam sabendo que o seu filho cometeu um delito pela imprensa, ou quando a polícia prende. Como é que pode alguém querer que o presidente da República embora tenha que assumir responsabilidade por todos os lados saiba o que está acontecendo agora na Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo ligada ao Ministério da Agricultura. Como é que eu posso saber agora o que está acontecendo com os meus ministros que não estão aqui.
Fátima Bernardes: Mas presidente, comparar com uma mãe zelosa, apaixonada, cega de amor, o senhor acha que o eleitor espera do senhor esse comportamento ou o comportamento de alguém que possa administrar e organizar, coordenar o governo.
Lula: Veja, isso não é administração. Administração você administra fazendo o que nós estamos fazendo. Primeiro, fazendo sindicância, mandando prender. Nunca foi presa tanta gente nesse país e de crimes que começaram em 85, 80, 90, são quadrilhas históricas no governo que estava embaixo do tapete e que nós resolvemos colocar os organismos públicos para funcionar. E a Polícia Federal tem trabalhado de forma excepcional. O Ministério Público tem trabalhado com a maior isenção possível e a Controladoria-Geral da União que é uma coisa criada por nós, com um ministro indicado por mim, tem feito praticamente todos os relatórios de todas as denúncias. Porque nós não queremos esconder absolutamente nada.
William Bonner: Só uma observação candidato. No caso específico do mensalão, esse escândalo da corrupção, na verdade o governo não denunciou nada, a denúncia partiu lá depois daquele escândalo nos Correios e mais tarde com as revelações, as denúncias do ex-deputado Roberto Jefferson. Mas a pergunta que eu queria fazer ao senhor diz respeito à traição. O senhor disse que a todos os brasileiros nesse caso que foi traído, mas até hoje o senhor não disse quem foi que traiu o senhor, não deu os nomes dos traidores. Num outro momento, por outro lado, o senhor manifestou solidariedade abertamente a ex-deputados petistas e a ex-ministros seus. Antes de se tornar presidente, a memória que o Brasil tem candidato, era de alguém que veementemente cobrava punição para quem quer que aparecesse diante de uma câmera de televisão suspeito de alguma coisa, mesmo que as culpas não tivessem sido provadas ainda. O que foi que fez o senhor mudar tanto de comportamento?
Boa a observação de Bonner sobre quem fez a denúncia. Mas, reparem que o apresentador fala da traição, fala do apoio que o presidente continua a dar aos que tiveram que ser afastados de seus cargos por causa dos escândalos de corrupção – entretanto, a pergunta é outra e, naturalmente, permite que Lula fale o que quer e não sobre a traição (respondendo sobre quem o traiu, por exemplo) e nem sobre o fato de estar apoiando pessoas que praticaram atos criminosos.
Lula: Primeiro você deve estar falando de outra pessoa. Eu nunca pedi para que alguém fosse condenado antes de se provar a sua culpa.
Mentira. Pediu o impeachment do ex-presidente Collor e ajudou a exigir o seu afastamento antes de qualquer julgamento (http://72.14.209.104/search?q=cache:U8-zKdA8ZY4J:www.presidenciadarepublica.gov.br/presidente+lula+participou+do+impeachment+de+collor&hl=pt-BR&gl=br&ct=clnk&cd=3.). Julgamento esse, aliás, que, correto ou incorreto, absolveu o ex-presidente por falta de provas. Coisa que Lula e o PT conseguiram que fosse, agora, o motivo pelo qual o próprio presidente Lula não pudesse ser afastado do cargo. E isso não poderia ter passado sem questionamento por parte dos apresentadores do JN.
William Bonner: Afastamentos, demissões.
Lula: Eu afastei todos que estavam dentro do governo federal foram afastados, todos, sem distinção. Todos os funcionários públicos seja de primeiro, segundo ou terceiro escalão.
William Bonner: O senhor afastou o ex-ministro da Casa Civil?
Lula: Foi afastado. Foi afastado.
William Bonner: O senhor o afastou?
Lula: Eu o afastei. Afastei o Zé Dirceu, afastei o Palocci, afastei outros funcionários que estavam envolvidos e vou continuar afastando. Agora, quando se trata de punir William, punir significa você respeitar o estado de direito. Eu quero pra todo mundo o que eu quero pra mim. O direito de provar que eu sou inocente e o meu acusador provar que eu sou culpado. O governo não acusa. O governo age. O governo não sai pra imprensa dizendo: ‘olha, tal pessoa cometeu um erro’, não, o governo pune, afasta e abre sindicância. E os órgãos do Poder Judiciário, da Polícia Federal é que vão investigar. E isso é a única forma de nós continuarmos combatendo a corrupção e a malversação do patrimônio público desse país.
Mentira, outra vez. Mas, nesse caso, William Bonner insistiu nas perguntas certas – dando a entender que não era verdade o que Lula falava – mas, ele realmente não pode fazer muita coisa além disso e muito menos obrigar o presidente a falar a verdade.
Fátima Bernardes: Antes da gente mudar então de assunto, o seu amigo Paulo Okamoto disse que teria pago uma dívida do senhor de R$ 30 mil, uma dívida que o senhor nem reconhece. Pelas sua declarações entregues à Justiça Eleitoral o senhor poderia até ter pago essa dívida. Por que o senhor deixou então ele arcar com esse prejuízo?
A pergunta seria: Como é que Okamoto poderia ter pago, do próprio bolso, uma dívida de R$29 mil, se ele ganhava, POR ANO, R$45 mil?
Lula: Primeiro, porque ele admite que cometeu um erro de não ter descontado na minha indenização quando eu me afastei do PT. Segundo, eu não devo ao PT, portanto eu não deveria pagar. O que eu disse é o seguinte: quer pagar você paga porque eu não vou pagar porque não devo ao PT.
Caberia, então, outra pergunta: Então, presidente, o senhor está dizendo que Paulo Okamoto pagou uma dívida – que, aliás, não tinha condições financeiras para pagar – mesmo depois do senhor ter dito que a dívida não existia? E, pelo que eu me lembre, presidente, tanto o senhor quanto o Okamoto disseram, na ocasião em que se divulgou o fato na imprensa, que o senhor nem sabia que ele (o Okamoto) havia pago a dívida. Como é que, agora, o senhor diz que falou para o Okamoto que se ele quizesse pagar a dívida que pagasse? Então, o senhor soube da dívida, antes do Okamoto pagar?
Fátima Bernardes: Mas o fato dele, de aliados dele, terem tentado tanto bloquear aquela quebra de sigilo, não pode levar o eleitor a pensar que havia algo a esconder?
Lula: É um direito dele não querer quebrar o sigilo dele. É um direito de qualquer cidadão. Amanhã isso pode estar acontecendo com você, pode estar acontecendo comigo, pode estar acontecendo com o William e nós vamos utilizar todos os mecanismos que o direito nos dá para que nós possamos nos defender.
William Bonner: Ainda que fosse uma questão indelicada, que indiretamente envolvesse o nome do presidente.
Aqui caberia: Mas, presidente, as acusações contra este senhor são muito graves, são crimes sérios. E a única forma de se obter provas sobre estas acusações é quebrar o sigilo bancário de Okamoto. Não há um só motivo para que a Justiça não permita que isso aconteça. Isso poderia, inclusive, se enquadrar em obstrução, pelo fato de estar atrapalhando e até impedindo que seja feita uma investigação adequada. Além do que o fato (agora sim) “indiretamente envolve(sse) o nome do presidente”.
Lula: Ainda que alguém pudesse imaginar que nesse país um presidente da República, sabe, se entendesse que tivesse qualquer culpa ficaria muito mais barato ter pago os R$ 29, R$ 28 ou R$ 27 mil. E eu continuo dizendo, quero aproveitar até a pergunta para dizer o seguinte: olha, não devo, não tomei dinheiro emprestado e por isso não paguei.
William Bonner: Presidente, vamos falar um pouquinho de segurança pública. Antes do senhor assumir a presidência, quando candidato, o senhor repetia: o Brasil não produz cocaína. Pra gente combater tráfico de cocaína, tráfico de arma tem que fechar as fronteiras, tem que reforçar a Polícia Federal, é um trabalho da Polícia Federal, nas fronteiras, nos portos, nos aeroportos do Brasil. Há quatro anos, o senhor é o comandante maior da Polícia Federal brasileira e, no entanto, o que se percebe hoje é que o tráfico aterroriza ainda mais a população brasileira. Onde é que o senhor errou?
Essa foi boa. Mas, infelizmente, serviu para o presidente sair falando das ações da PF. É bom que fique claro que nem tudo que a PF faz é por conta do Governo. Ela age muito por conta própria também – não se deixa amordaçar e acorrentar pelo PT e pelo governo do presidente Lula. Uma parte da PF, graças a Deus, age livre e corretamente. Resultado: terminaram a entrevista com a única coisa que Lula tem números bons para oferecer e agradar a população – embora a gente saiba que ele não tem lá muitos méritos em relação ao trabalho da PF. Perguntem aos policiais sobre a Medida Provisória 305 (http://infomix-cf.blogspot.com/2006_07_01_infomix-cf_archive.html - mais para o final das publicações, sob o título MP 305 – Protesto Geral)
Lula: Eu penso que nós precisamos conversar esse assunto com a maior seriedade. Em primeiro lugar, o Brasil tem praticamente 17 mil quilômetros de fronteira, não são 17 metros. São 17 milhões, 7,760 milhões de costa marítima e quase 9 milhões de fronteira seca. Se você tivesse um exército de 3 milhões de soldados, ou a Polícia Federal com 4 milhões, ainda assim você não controlaria toda a nossa fronteira.
Meu Deus! Sem comentários!
William Bonner: Mas o senhor como candidato parecia desenhar um quadro mais fácil.
Lula: A Polícia Federal está desbaratando quadrilha e prendendo quadrilha vinculada ao narcotráfico como jamais foi preso nesse país. Quando terminar a entrevista, eu vou entregar para você um relatório do trabalho que a Polícia Federal fez.
William Bonner: Nós acompanhamos como jornalistas.
Lula: Para vocês perceberem o seguinte: que quando sai a notícia, sai a notícia que a polícia desbaratou uma quadrilha, mas não diz desde quando funcionava essa quadrilha. Dá a impressão que aconteceu ontem, não, aconteceu há muito tempo. E nós estamos não apenas investindo de forma excepcional na inteligência da Polícia Federal, como estamos investindo em criar condições para que ela tenha instrumento para trabalhar.
Lula: Veja, eu pretendo continuar dando seqüência ao que nós estamos fazendo. Que o Brasil viva o seu melhor momento econômico, o Brasil cresce o emprego, cresce a economia, crescem as exportações e importações, a única coisa que cai é o salário, digo, é a inflação e os juros que estão caindo. O resto, os trabalhadores tiveram aumento de salário, os aposentados tiveram aumento de salário e o nosso tempo acabou, é uma coisa que está baixando também.
Ato falho, presidente, ato falho: “a única coisa que cai é o salário”. Bem, agora o presidente falou uma coisa que é verdade. E olha que o pessoal da campanha já devia estar comemorando (porque esse negócio de extensão de fronteira quase ninguém sabe mesmo...) o desempenho do presidente, por ter falado tudo o que queria!
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